quarta-feira, maio 27, 2009

40 anos do Assassinato do Padre Antonio Henrique Pereira Neto

O campus da Universidade Federal de Pernambuco foi o local escolhido pelos matadores do Padre Antonio Henrique Pereira Neto para jogar o seu corpo, ao que parece, ainda com vida, pois quando foi encontrado verificou-se que suas mãos encrespadas guardavam alguns pedaços de capim. Era a madrugada do dia 27 de maio de 1969.
Embora o crime jamais viesse a ser solucionado, uma certeza vem dessa não solução: a tortura e morte do jovem sacerdote católico foi um recado enviado ao Arcebispo de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara, um bispo atento às necessidades do seu rebanho quando boa parte da sociedade brasileira preferia viver como se não estivesse ocorrendo uma ditadura no país, um cerceamento das liberdades.

Nascido em 1940 e ordenado presbítero em 1965, o jovem sacerdote estava acompanhando e orientando jovens adolescentes de classe média e dava aulas no Colégio Marista. Esse trabalho de orientação de jovens causava temor aos dirigentes do país, uma vez que a orientação da arquidiocese era de que a ação pastoral levasse à consciência social e, conscientes, os jovens poderiam superar a doutrinação que pretendia levar toda uma geração a desconhecer o que verdadeiramente vinha ocorrendo no país. O pouco tempo de vida apostólica do Padre Henrique não lhe permitiu deixar muitos escritos sobre a sua ação. Seu trabalho com os jovens consistia muito em ouvir e conversar, o que deve ter sido uma grande virtude do sacerdote que atendia a juventude, pois os jovens sempre precisam ser ouvidos, especialmente em situações de arbítrio que não lhes permitem viver os ideais que a juventude acalenta. Mas se temos poucos escritos do Padre Henrique é porque pouco se escrevia naqueles anos em que todos podiam ser suspeitos e cada anotação poderia incriminar a si mesmo ou a algum amigo.

Os jornais não noticiaram a morte do padre, e foram proibidos de noticiarem os atos fúnebres – o velório que ocorreu na Matriz do Espinheiro e o sepultamento que ocorreu no Cemitério da Várzea. Milhares de pessoas levaram, a pé, o corpo do padre desde o Espinheiro até à Várzea, um percurso de 10 quilômetros, acossados pela polícia que queria tomar o corpo do padre das mãos do povo. O assassinato do padre Henrique ocorreu dias após a tentativa de matar o estudante Cândido Pinto. Esses acontecimentos corroboram a idéia de que havia um esquadrão para matar os que se opunham ao regime.

Na nota em que informou a morte do padre Antonio Henrique Pereira Neto, a arquidiocese desejou “Que o holocausto do Pe. Antônio Henrique obtenha de Deus a graça da continuação do trabalho pelo qual doou a vida e a conversão dos algozes”.

domingo, maio 24, 2009

O Boi da Macuca e o cheiro do povo

Este final de semana foi no Agreste Meridional, hospedado em Garanhuns e trabalhando em Correntes, indo pela manhã e retornando à tarde. O local de trabalho a casa localizada na Fazenda Macuca, conversando sobre o Ponto de Cultura Boi da Macuca. O Boi da Macuca nasceu da imaginação de Zé, o Zé da Macuca, geólogo que abandonou uma carreira vitoriosa no grupo João Santos para ocupar o espaço geográfico herdado de seu pai, e foi aprender a cuidar da terra e do gado, mas descobriu a existência de um boi mítico que está presente na imaginação das pessoas, como estão, o dos seus trabalhos, mas que, com o crescimento da bacia leiteira, ou mesmo com a criação de gado para o corte, faz diminuir a população de cidades como Correntes, Palmerina, entre outras.

Estive como ouvinte de debates sobre ações que devem ser realizadas para tornar o Ponto da Macuca mais evolvido com a comunidade, para além dos divertimentos, das celebrações que ali são realizadas: desfile de carros de boi, instrumento de trabalho fundamental naquela região por conta das estradas, carros de boi embelezados por seus proprietários, que desfilam para eles mesmos, perdidos na área rural. E o reencontro com as tradições musicais locais, tão forte que fez o Boi da Macuca ganhar o carnaval de Olinda, ir até a Alemanha e ser a vitória daquela região na derrota na copa da França. Ouvi de concertos de música renascentista no meio do silêncio dos espaços da fazenda e de um certo festival que, segundo alguns, era uma “estaca de madeira”. E conheci João, o “padre” apaixonado por uma “tequinha”. E os mistérios da Macuca, e tudo isso por conta da interação promovida pelo Pontão de Cultura Canavial.

Enquanto trabalhava chegou um senhor Eraldo que, ao ouvir meu nome e a minha voz se emocionou ao reconhecer um professor de sua juventude, ele hoje formado em filosofia, encontrando quem apontou o caminho da universidade. Tarde alegre, compartilhada com minhas companheiras de viagem, Lilica e Fátima Menezes, enriquecida pela companhia dos participantes da Sociedade dos Artistas de Garanhuns, proponentes do Ponto de Cultura Boi da Macuca, gente ligada a literatura, à música, á arte plástica. Ao final da tarde, cervejas, boa cachaça, alegria dos muitos participantes do Boi da Macuca que vieram conversar conosco e nos ajudar a entender o lugar. Vi coisas que pensei nunca mais veria: refrigeradores Philips, geladeiras SOCIC funcionando. Essas geladeiras acompanharam a minha infância e juventude na mercearia de meu pai. Elas sumiram de meus olhos à medida que fui virando professor, mais ou menos à mesma época em que Eraldo ouvia as minhas aulas.

Mas a mais gostosa risada foi dada em um curral com bezerros: ali estava entronizado no lugar onde sempre quis estar, o rosto risonho de quem dizia preferir o cheiro de bosta de cavalo que o cheiro do povo.

O Boi da Macuca tem o cheiro do povo

quinta-feira, maio 21, 2009

"teólogo" sem ética usa o patrimônio moral do DOM para ganhar dinheiro

Estou pondo no blog uma notícia que recebi do Instituto Dom Hélder Câmara, nno qual tenho interesse e ao qual estou ligado. A nota mostra como algumas pessoas perderam totalmente o senso de vergonha, ética, respeito. Precisamos erguer novamente certas qualidades, certos comportamentos como bons e outros como negativos e destrutivos. Esse "senhor" merece nosso repúdio.


Prezados amigos

A mensagem hoje não é de um bom anúncio: o Instituto Dom Helder Camara - IDHeC foi enganado por uma pessoa, de nome Adriano de Lima, passando-se por irmão da Comunidade “Anuncia-me”, poeta, teólogo e restaurador, atuante na Paraíba, que compilou escritos de Dom Helder e publicou o livro “As 100 melhores Meditações de Dom Helder”, sem nenhum pedido prévio ao Centro de Documentação Helder Camara – CEDOHC, guardião do acervo literário do Dom.
Tínhamos informações sobre o assunto e procuramos manter contato para esclarecer a questão dos direitos autorais quando, na última segunda-feira, 18/05 - de passagem por Recife, ele solicitou ao CEDOHC banners por empréstimo e alguns livros e postais em consignação, para uma palestra sobre Dom Helder em Campina Grande, e foi atendido.
Com imensa surpresa, fomos informadas na terça-feira que o referido Adriano se colocou como membro do IDHeC/CEDOHC, cobrando cachê pela palestra e uma quantia considerável pela Exposição que, segundo ele, seria a mesma produzida pelo CAAL, Universidade Cândido Mendes, CESEP e Editora Paulinas, quando na realidade trata-se de fotos coladas em cartolinas, causando uma grande decepção aos contratantes e aos convidados do evento, entre bispos, padres, religiosos e alunos. E o mais grave, comunicou que a quantia cobrada seria revertida para o CEDOHC. Nosso Dom, sinceramente, não merece esse ultraje de sua memória.
Como o Sr. Adriano já anunciou uma série de eventos onde deverá participar nos mesmos moldes (incluindo também entrevistas em rádios e TV´s), o IDHeC comunica que este cidadão não tem nenhum vínculo com essa instituição e nem está autorizado a falar ou promover exposição sobre Dom Helder em nome do CEDOHC, braço cultural do IDHeC.
Nas homenagens pelo Centenário do Dom, já foram realizadas várias palestras, desde 2008, todas proferidas por colaboradores do IDHeC, em Recife e em outras cidades brasileiras, sem nenhum custo para as entidades que solicitaram, pelo contrário, todas as pessoas sacrificaram seus compromissos profissionais e pessoais para cumprir a missão de, realmente, semear o ideal eclesial e social de Dom Helder, com muita alegria. Registramos ainda que a Diretoria e o Conselho Curador do IDHeC são constituídos por voluntários, que não cobram participação em eventos.
Achamos importante comunicar de imediato a todos que receberam nossa programação (que vai ser retificada), ou que forem abordados para a mesma ação proposta pelo Sr. Adriano (em nome do IDHeC/CEDOHC), que não participem nem aceitem nenhuma atividade que envolva este cidadão, o qual será notificado dessa decisão da Diretoria e advertido de que, caso insista, o IDHeC tomará as medidas cabíveis para o caso.
Pedindo que desculpem a nossa ingenuidade, fruto da confiança que aprendemos a ter nos irmãos, aproveitamos a oportunidade para enviar nosso fraternal abraço.

Recife, 20.05.2009
INSTITUTO DOM HELDER CAMARA
LUCINHA MOREIRA – Presidente do Conselho Curador
ELIZABETH (BETE) BARBOSA – Diretora Cultural

segunda-feira, maio 18, 2009

Raio cai em tracunhaém e em jornalistas

Nesta manhã, no noticioso de uma emissora, que está a se tornar uma revista e quase uma matéria insossa sobre os acontecimentos, exceto um ou outro comentário, foi interessante ver o rosto dolorido de conhecido conhecedor de vinhos, após uma reportagem sobre a morte de quatro jovens em um campo de futebol na cidade de Tracunhaém. A morte dos adolescentes deveu-se a uma descarga elétrica, um raio. A reportagem mostrou fotografias de dois dos rapazes mortos. A dor apresentada pelo apresentador foi acompanhada com uma frase que, se a memória não falha, era assim: “a cidade onde ocorreu este lamentável incidente é tão pobre que dois dos rapazes não tinham fotografias a serem mostradas.”
Tracunhaém está presente a história de Pernambuco e do Brasil desde 1710 quando alguns senhores de engenhos, de Olinda, foram até os seus engenhos naquela região, que dista 50 quilômetros do Recife, para lá se organizarem em pequeno exército e atacar o Recife, recém elevado à condição de vila. Os donos de terras e de cana de açúcar não conseguiam permitir que Recife crescesse no século XVII, jamais permitiram que a riqueza produzida nas terras que lhes pertencem por terem sido doadas pelo rei português jamais chegasse àqueles que produzem a riqueza. Esse acontecimento fútil, mas capaz de provocar constrangimento a especialistas em degustação de vinhos, é uma mostra do que ocorre na Zona da Mata Norte de Pernambuco, uma região que produz riquezas e que mata seus trabalhadores de fome por conta das usinas e dos usineiros, a quem o atual presidente chamou de heróis, menos de um ano.
Tracunhaém é um pequeno retrato do que sofre o povo brasileiro, um povo que ganha tão pouco que não pode pagar uma foto 3x4 de seus filhos. O mais surpreendente, é que a equipe da famigerada emissora de televisão que esteve no local, sique utilizou equipamentos para fazer a notícia. É esse o tipo de jornalismo que se faz hoje. Pobre, como a mentalidade dos ricos que dominam este país.

domingo, maio 17, 2009

Um fim de semana na Mata Norte

Acordo com salvas de canhão em homenagem ao 176º aniversário da emancipação de Nazaré da Mata. Em algumas leituras que fiz, ela, Nazaré, parece ter sido um povoado ligado a Olinda, outras dizem Igarassu. De qualquer modo ela parece ter sido o mais antigo esforço de ocupação do norte da Mata, cercando os duzentos anos, ainda que pese ter sido em Tracunhaém que, senhores de engenhos em desacordo com a ereção do Recife como cidade em 1710, viessem se organizar em uma Liga para atacar a novel vila. Mas o “engenho” que originou Nazaré ficava bem mais para dentro, mais acima do Rio Tracunhaém, encontrando-se mais próxima do Sirigi, em terras que hoje fazem parte do município de Vicência, criado a partir de Nazaré, no início do século XX.

Mas, se pernoitei em Nazaré, onde ocorreu festa durante a noite, com forrozeiros mais à antiga e bandas que dizem tocar forró estilizado, um nome que esconde a preferência por um outro gosto que, para alguns é bom para outros é ruim, cujos nomes sempre indicam misturas improváveis ou peças íntimas do vestuário feminino, grande parte do sábado foi investido em contato com jovens que auxiliavam crianças e pré-adolescentes em atividade lúdicas e leitura, no Ponto de Cultura Estrela de Ouro, na zona rural de Aliança, (uma cidade que nasceu do desmembramento de Nazaré em 1932), uma passagem rápida por um curso que está introduzindo vinte e cinco jovens (moças e rapazes) no mundo da produção cultural, especialmente na criação e na feitura de projetos culturais para a região. O avanço da monocultura da cana sobre todas as demais atividades econômicas, está definindo essa região como uma área de turismo, não apenas rural, mas também cultural. E parece ser interessante anteciparmos na formação de certas habilidades que serão necessárias nesse mundo que se cria como subproduto da busca por combustíveis orgânicos renováveis; é isso que a Associação Reviva está fazendo juntamente com Afonso Oliveira Produções. Depois fui encontrar-me com o cirandeiro João de Limoeiro, que vive de cantar ciranda a quatro décadas. É que este artista do verso e das melodias está participando de um projeto que envolve rádios comunitárias de Goiana, Nazaré da Mata, Vicência e Carpina, um programa nomeado Rádio Canavial, cujo objetivo é fazer conhecida a produção dos grupos artísticos da região, e que também eu ajudo. Aliás, necessário que se diga que dito programa acabou de receber o prêmio “Comunicação Livre” do MinC.

Hoje, domingo, passei o dia em Condado, cidade filha de Goiana, participando de um seminário que visa criar a Carta de Cultura de Condado, objetivando a criação de um Conselho Municipal de Cultura. Foi um dia agradável de encontro com Biu Alexandre e Antonio Teles, dois grandes mestres de Cavalo Marinho, seu Francisco, Mestre cirandeiro, Rubem, músico presidente da Filarmônica 28 de julho e jovens futuros mestres da cultura popular. Recebi de José Paulo Freitas um cordel de sua autoria. José Paulo é avô da jovem que coordenava o Seminário de políticas Culturais.

Condado é uma cidade com baixo índice de desenvolvimento humano - IDH, e acreditamos que apostando na cultura local, sem negação de outras tendências culturais, poderemos auxiliar a reverter essa situação que, por ter sido historicamente criada é, por isso, superável.

quinta-feira, maio 14, 2009

Diplomacia e racismo

A diplomacia é uma atividade desenvolvida de maneira silenciosa, de maneira que muitas vezes só sabemos seus resultados algum tempo depois Contudo, nesses tempos de multimeios, de caminhos diferentes para acessar informações, vez por outra sabemos das negociações diplomáticas ainda em andamento. É assim que sabemos sobre a possibilidade de o um brasileiro vir a assumir posto de maior direção na UNESCO, uma agência da Nações Unidas para a Educação, a Cultura e a Ciência. Este é um cargo de grande importância, tanto pelo grande orçamento que ele envolve (e esta é a razão maior para muitos) é um espaço que, se ocupado, permitirá aos educadores e agentes culturais fazerem pressão para que o país venha a investir um pouco mais nessas áreas fundamentais para a vivência plena da cidadania.

As possibilidades de o Brasil vir a assumir a direção da UNESCO aumentaram desde que a França e os Estados Unidos retiraram o apoio que estavam dando ao representante do Egito, por este ter feito declarações racistas, ameaçado queimar livros escritos em hebraico nas bibliotecas de Cairo, e coisas semelhantes. Deixaram de apoiar o candidato do Egito para apoiar um candidato brasileiro que é funcionário da UNESCO. Ora, assim parece certo que o Brasil venha a presidir a UNESCO. Contudo, o Itamaraty está amarrado a um acordo que leva o Brasil a apoiar um candidato dos países árabes, mesmo contra um brasileiro; mesmo que o candidato do outro país seja um racista declarado, mesmo que o governo atual tenha criado uma Secretaria Especial para a Igualdade Racial. Até o dia 30 de maio o Brasil terá que se definir entre apoiar a si mesmo para assumir a direção da UNESCO ou apoiar um racista.

Por falar em racismo, vi ontem, dia 13 de maio, pela televisão, o presidente da Secretaria para Igualdade Racial acusar um funcionário do Congresso por sua condição de negro que, segundo ele – o presidente, infelizmente, apresenta-se contra a criação de cotas raciais no Brasil. O comportamento do presidente da Secretaria de Igualdade Racial é uma demonstração do que poderá vir a ser a igualdade pretendida por ele. É um perigo esse caminho de construção de um estado segregado por conta de uma “dívida histórica”, que não está sendo cobrada aos portugueses, aos ingleses, aos holandeses e a todos os que acumularam capital com o comércio de escravos entre os séculos XV e XIX, inclusive os sobas africanos que aprisonavam e vendiam os africanos como animais para os comerciantes europeus. Toda essa "dívida histórica" deve ser cobrada apenas ao Brasil!! A Secretaria Especial para a Igualdade Raqcial está fazendo um esforço enorme para entrar nas universidades,mas pouco esforço para garantir a escola básica (fundamental e média) para os negros pobres das favelas, das “comunidades”, dos bolsões de pobreza. Há pouco esforço para que se construa infra-estrutura de esgoto, serviço de água, iluminação das ruas, etc, que beneficie os negros, índios, mestiços, todos pobres e brasileiros. Sim, todos eles são brasileiros e este país e suas leis devem ser feitas para todos os barsileiros, não apenas para alguns, como nós estamos vendo no gueto chamado Congresso Nacional, com tratamento diferenciado para alguns cidadãos.

Continuo a entender que se medidas forem tomadas para atender os brasileiros, e não apenas parte deles, o Brasil melhoraria, e não correria o risco de chocar ovos de serpentes.

As boas intenções de se pagar “dívidas históricas” podem pavimentar o caminho de mais um gueto: além do gueto da miséria cultural e educacional, teremos os guetos que separarão os brasileiros por raças, pela cor da pele, pelo cabelo, pelo nariz, pelo lábio, pelo formato da cabeça. Exatamente como faziam os nazistas. Nazismo não é questão de pele, é questão de mentalidade, de crença em superioridades e moralidades a-históricas.

Enquanto isso, esperemos, mas não estaticamente, a decisão do Itamaraty e o Congresso Nacional.

domingo, maio 10, 2009

Mãe e os doces de mandioca

Este texto foi escrito para o Programa Rádio Canavial, um projeto que envolve rádios comunitárias de Goiana, Nazaré da Mata, Carpina e Vicência. Foi o editorial desta semana, em homenagem às mães. Assim eu pensei como podemos conversar com as nossas tradições, nossa mãe natureza e nossas mais primeira tradição.


AGRADECENDO ÀS NOSSAS MÃES


No mês de maio temos alguns desafios. Os agricultores estão atentos a limpeza dos roçados, evitando que o mato venha a cobrir os pequenos leirões das verduras, das hortaliças e dos tubérculos. Um outro desafio do mês de maio é conversar sobre mulheres. É que no mês de março a gente já conversou aqui sobre o dia das mulheres e, agora, tem o dia das mães. E a gente fica pensando: e as mães não são mulheres? É, as mães são mulheres, e são mais que uma mulher.

Às vezes a gente fica olhando a mandioca, de onde vem a farinha que alimenta a gente, alimenta os nossos filhos, nossos amigos e nossas amigas. Da mandioca vem a farinha que pode ser transformada em farofa, que se mistura com o feijão ou com a fava. Tem gente que prefere misturar a farinha com o ovo duro e machucado. E tem aqueles que preferem misturar a farinha com o jirimum para acompanhar uma carne um peixe. Mas também da mandioca se faz a goma para o pé-de-moleque, o bolo ou para o cuscuz molhado. E também serve para fazer a tapioca, que pode ser no coco, com açúcar, ou como essas tapiocas mais modernas, com leite condensado, queijo e outras riquezas da nossa cozinha. Mas o que tem isso a ver com o dia das mães, além do fato de serem elas que nos ensinam a gostar dessas iguarias de nossa terra?, iguarias que nossas avós criaram.

É que a Mandioca é uma mulher.

Uma lenda dos nossos antepassados índios diz que havia uma menina muito bonita, mas tão bonita que todas as outras tinham ciúme dela. O nome dela é Mani. Um dia houve uma grande seca e faltou comida para a tribo. Não se sabe bem porque, mas Mani ficou doente, trazendo muita tristeza para todos da tribo, mesmo para as invejosas. E quando Mani morreu, a tribo fez uma cova não muito distante da taba onde viviam.

Depois de duas luas, a tribo viu que da cova subia uma haste, e na quarta lua eles puxaram a haste e viram que o corpo de Mani virava uma raiz forte. Eles chamaram essa raiz de ManiOca, ou seja, a Casa de Mani. E depois perceberam que podiam fazer muitas comidas daquela raiz. E nunca mais a tribo passou fome, pois a manioca, ou nandioca, virou comida para todo mundo. E Mani, passou a ser a vida daqueles nossos antepassados. Mani é como a nossa mãe primeira, a mulher que todo dia dá um pouco de sua vida para que todos nós continuemos a viver alegres e felizes. Da mesma maneira que Mani deu a sua vida para que sua tribo não morresse, assim, a nossa mãe é a mulher que alimenta a gente de carinho, que cuida da gente, que sonha com a gente, que não dorme enquanto a gente não chega em casa. É um amor que sacia.

Com a história de Mani e da Mandioca, a Rádio Canavial e o Movimento Canavial desejam que as mães de todos os canavieiros, e todas as canavieiras que são mães, sejam muito felizes.

quarta-feira, maio 06, 2009

Eles querem nos vendar

Vez por outra a gente se surpreende com as coisas que estão vindo da capital federal. O interessante é a sua capacidade de não suspeitar que existe um país, uma nação além do aeroporto. Mal se consegue convencer que o dinheiro do povo não pode ser usado para pagamento de passagens para parentes, vem o presidente da República e diz que não acha nada de mais que se use o dinheiro do parlamento para que a esposa do parlamentar viaje com ele. Fico imaginando o que diria o presidente da República se os professores universitários, convidados para fazer palestra no exterior, sobre suas pesquisas, levasse à tiracolo a sua esposa, às expensas do Conselho Nacional de Pesquisa. Por menos que a farra das passagens, o Reitor da Universidade de Brasília perdeu a magnificência no tratamento por não saber tratar a coisa pública. Ora, senhor, não repita essa bobagem que deve ter sido dita só para agradar o apaixonado deputado Sílvio Costa, da base aliada, que usou dinheiro público para dar mimos ao seu amor.

Mas tem mais. Agora os deputados, e de todas as bases, os aliados aliados e os aliados da oposição, pretendem aprovar uma lei que obrigará os brasileiros a votar em lista fechada, definida pelos caciques dos partidos políticos. A isso eles estão chamando “reforma eleitoral”, e que poderemos chamar de uma garantia para que os mesmos que estão na câmara e no senado, hoje, possam se reeleger. Se o voto for de lista fechada, ninguém saberá mais em quem votou, pois serão eleitos aqueles que os partidos definirem como os primeiros da lista. Essa “reforma eleitoral” que fecha as possibilidades do eleitor promover mudanças no parlamento, está sendo costurada para ser posta em prática na próxima eleição. Vamos ficar atentos e conversar sobre esse assunto com o máximo de pessoas possíveis. Não podemos permitir que eles criem uma lei que nos obrigue a votar de olhos vendados.

terça-feira, maio 05, 2009

Menos ciências nas universidades? Uma nova reforma na universidade

Recebi telefonema de um professor de Geografia. Estava horrorizado com notícia que havia lido no jornal A Folha de São Paulo. A informação era de que o Ministério da Educação está estudando o fim das disciplinas Geografia e História para o Ensino Fundamental e Médio. O mesmo ocorreria com as demais ciências, e se utiliza o argumento de que o ensino está muito fracionado e é necessário promover certa unidade dos conhecimentos. Isto vindo de um governo que estimulou o fracionamento do ensino com indicação para criação das mais diversas disciplinas que objetivam mais dividir que unir o conhecimento é, evidentemente estarrecedor. Já não estarrece tanto o modo que tais disposições vêem sendo tomadas pelo Ministério da Cultura, que tem desenvolvido a cultura de não ouvir os professores.

Houve um tempo, na Ditadura Militar que se tentou acabar com o ensino de História, criando a área de Estudos Sociais e cursos de Educação Moral e Cívica, Organização Social e Política do Brasil, para que todos pensassem do mesmo modo. A Ditadura foi derrotada, os cursos de História e Geografia permaneceram, embora enfraquecidos nos ensinos Fundamental e Médio, pois perderam carga horária. Após a Ditadura ocorreu um amplo debate com os educadores e a sociedade civil para estabelecer as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira; em governos anteriores foram estabelecidos Parâmetros Curriculares para os diversos níveis de ensino, mas as instituições de representação dos professores foram ouvidas. Isso não parece acontecer agora. E não é de hoje.

O atual governo, esse que atualmente nos gerencia, acostumou-se à obediência cega ou à compra de assentimento. A utilização de Medidas Provisórias (novo nome para Decreto Lei) ensinou ao governo que assim é mais fácil, pois essas medidas são a “pedagogia do bode na sala”, que é a colocação de algo inaceitável e, ao mesmo tempo se põe o bode na sala, com todo o fedor. Então as pessoas reclamam e se tira o bode. Com a saída do bode o inaceitável além do bode passa a ser aceito. Com a saída do bode que não concordar é porque é contrário ao interesse do Brasil, pois o gerente se tornou a própria empresa que gerencia. Não há contestação, pois todos os movimentos sociais foram cooptados, de alguma forma, e fazem parte da gerência. A política do fato consumado é que se observa em toda a prática gerencial de nossa federação.

Assim está sendo com a lenta transformação das ciências humanas – licenciaturas e bacharelatos – em cursos técnicos, pois cada vez há menos tempo para os debates quer levam à compreensão dos fenômenos para que as pessoas “aprendam as técnicas” de ensinar. O que ensinar e compreender o que se ensina é secundário. Tudo em decisão tomada no Conselho Nacional de Educação sem ouvir, realmente ouvir, os professores das ciências, pois bastou para os pedagogos com assentos no Conselho, ouvir o que diziam os pedagogos de fora do Conselho. Enquanto isso cresce o número de universidades e de cursos superiores e a qualidade desses cursos é cada vez mais questionada, pois as decisões são tomadas para atender interesses imediatos, alegrar políticos da base aliada que, sabemos constantemente, não tem base alguma, exceto a flutuação dos interesses eleitorais. E isso é aplicado à educação!!!

Talvez tenhamos, mais uma vez o silêncio das Associações dos professores de Historia, de Geografia, de Matemática, de Química, etc., pois já tivemos esse silêncio quando ocorreu a diminuição de 200 aulas das ciências, ao mesmo tempo em que ocorreu o aumento do ano letivo. E tudo imposto, ou negociado com um bode na sala. Como dizia um pedagogo: quanto mais se fala em democracia na escola menos ela é democrática.

Esse é um governo, um gerente – e um gerente não é o dono – que fala muito em democracia, mas que conversa pouco e não gosta que lhe conteste. Só o reconhecimento e auto-reconhecimento lhe retro-alimenta e o que o impulsiona é o desejo da permanência.

Cabe a sociedade discutir se quer essa nova reforma do ensino universitário.

domingo, maio 03, 2009

É tempo de ter nojo

Este texto foi publicado no Jornal Panorama da Mata Norte, da cidade de Goiana, PE, e foi publicado na úlitma quinzena de abril



Um amigo perguntou-me se eu havia lido, em uma das revistas semanais que circulam em todo o território nacional, a reportagem sobre a quantidade de dinheiro pago por nenhum trabalho no Senado Federal, local de trabalho de 81 senadores que tem para servir a cada um, cerca de 140 funcionários diretores: ou seja, quase dois funcionários para cada um dos senadores. Antes que eu respondesse a pergunta, uma pessoa que estava ao meu lado disse que começou a ler, mas, por puro nojo, não conseguiu terminar a leitura. Disse que teve vontade de vomitar lendo que há um expressivo número de funcionários com salários superiores a R$25.000.00 (vinte e cinco mil reais), salário maior que o recebido por um juiz do Supremo Tribunal Federal, o que é proibido pela Constituição. A ânsia de vômito que essa pessoa sentiu é porque essa aberração está ocorrendo em um lugar onde estão pessoas escolhidas para fazer leis que garantam a tranqüilidade e felicidade dos brasileiros. Realmente não há como não ficar enjoado ao saber que um ex-presidente da república é o principal fiador dessa nojeira e, o que é pior, ele é conselheiro do atual presidente da República.
Vez por outra, recordo que uma das frases mais repetidas, para criticar os abusos dos ditadores, veio da inteligência de Rui Barbosa. Era mais ou menos assim: “de tanto ver os desonestos vencerem na vida, um homem começa a ter vergonha de ser honesto”. É essa a sensação que os brasileiros comuns, que jamais serão escolhidos para ser candidatos a qualquer posto eletivo, sentem; e sabem que a desonestidade já alcançou a quase totalidade da sociedade, pois assistimos como sempre aparecem pessoas que furam fila, estudantes que copiam e colam “pesquisas”, professores que julgam trabalhos que não lêem, diretores de repartições que chegam atrasados, médicos e dentistas que nunca chegam, padres que rezam missa com medo de perder o trem, pastores que pensam que Deus é surdo, agentes do Estado que agem como gente sem honra e tantas coisas mais... Só o conjunto dessas ações desonestas é que pode explicar que não haja revolta quando sabemos de tantos ataques aos cofres públicos, por que ficamos sabendo que há uma média de cinco assassinatos por dia em nosso Estado e julguemos que isso é normal?
Nós nos acostumamos a ouvir sobre tantas falcatruas que começamos a pensar que o comum é roubar. O presidente faz um comentário racista, mas não há qualquer questionamento, pois não a vale a pena ser honestos e lutar para que se entenda que a cor da pele não explica a exploração. Quem vai dizer que quem está no poder comete erros? Não respeitamos os sinais de trânsitos e achamos que isso não é crime, da mesma maneira que nossos filhos acham engraçado tratar mal seus colegas e seus professores.
É tempo de termos nojo do que ocorre em nossos parlamentos, mas é tempo de começarmos a ter nojo de nosso comportamento que aceita toda essa nojeira.

sexta-feira, maio 01, 2009

Dia do Trabalhador

Hoje é o dia Primeiro de Maio. Quando menino, lá em Nova Descoberta, eu aprendi que este é um dia dedicado ao Trabalhador. Hoje dizem que é o dia do trabalho. Mas prefiro sempre pensar que é o dia em homenagem ao Trabalhador, ao operário. Talvez porque comecei a saber dessas questões por conta da Juventude Operária Católica, a JOC, que conheci ainda bem menino, nas reuniões que os jocistas faziam em uma casa na Subida do Olho d’Água, dirigidas por Pedro, cada sábado, e eu os ouvia cantar o hino da JOC, que dizia mais o menos assim “ó trabalhador, é teu labor fecundo, sem ti, o que será do mundo? Conhece agora o teu valor, ó trabalhador!”.

Nova Descoberta era um bairro operário e grande parte de seus moradores produziam a riqueza nas fábricas da Macaxeira e da Torre. Lembro de “seu” Passarinho, um operário que tinha mais que oito filhos, ele morava no Córrego do Eucalipto e fazia suas compras na mercearia de meu pai. Como a maioria dos habitantes de Nova Descoberta, pagava foro à família Marinho e Rosa Borges, pelo terreno onde construiu sua casa. Os Rosa Borges se diziam propriedades daquelas terras. Anos mais tarde, quando já não mais existia a JOC, e “seu Passarinho estava velho e três dos seus filhos haviam ido para São Paulo, grupos ligados à pastoral da Igreja Católica – o Movimento da Cebola - provou que aquelas terras não pertenciam àquelas Famílias. Durante anos os pobres de Nova Descoberta foram espoliados com o pagamento semanal de uma dívida indevida. Meu pai, como muitos outros, comprou o terreno onde construiu a nossa casa à Imobiliária Marinho, daquela família que deu o terreno para a construção da Igreja Matriz.

Mas hoje é o dia do Trabalhador, e quero dirigir minhas lembranças nessa direção. Vez por outra ocorriam greves, havia demissões, e tudo isso repercutia na economia de nossa família e fazia sofrer homens honestos, como seu Aurino, que morava no morro que ficava por trás de nossa casa e muitos outros que se perderam no labirinto do meu tempo. A caderneta do fiado muitas vezes acumulava dívidas que não foram pagas por conta do desemprego, que muito cresceu após o golpe de sessenta e quatro, pois aquela foi década da falência das fábricas de tecidos, apesar dos operários terem perdido a estabilidade no emprego, recebendo em troca o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e a criação de Banco Nacional da Habitação. Depois as fábricas fecharam, o desemprego cresceu e Nova Descoberta foi crescendo em direção de ser uma favela, um lugar com população superior às possibilidades de uma vida humana decente. Hoje Nova Descoberta é um bairro com uma população de uma média cidade do Sertão.

Pedro, que me lembre, se casou com Lindalva, filha de seu Frederico, um dos primeiros intelectuais que eu conheci, sempre com um jornal debaixo do braço e disposto a uma boa discussão. Aberto ao mundo e ao amor, seu Frederico era um católico ecumênico, casado com uma Batista. Nunca mais soube de Pedro e de Lindalva!

Acordei neste Primeiro de Maio, com saudades dos jocistas dos anos sessenta, com quem aprendi que os operários tinham alegria no meio do sofrimento. Foram meus primeiros contatos com a mística do padre José Cardjin, o belga filho de um operário fundador da JOC. Mais tarde conheci os seguidores do pensamento de Karl Marx, também em Nova Descoberta, que também combatiam a exploração que sofrem os operários, nas fábricas, nos seus lugares de viver. Ainda gosto de cantar o estribilho do hino da JOC.

Parece que o que restou na memória é um projeto de vida que vi na vida de muitos operários, como José Francisco, preso durante a ditadura e militante até o último dia de sua vida; como Lorena, uma das mulheres mais corajosas que conheci e refundadora da JOC, quando ela se transformou em Ação Operária Católica, sob a orientação de Padre Romano e, mais recetemente em Movimento dos Trabalhadores Cristãos – MTC.

Ó Trabalhador,
É teu labor fecundo.
Sem ti, o que será do Mundo?
Ò trabalhador!