terça-feira, julho 15, 2008

Os ciganos, nossa carteira de inquietação

Recentemente o governo italiano tornou público o seu interesse em identificar todos os ciganos que entram na Itália. Diz que o objetivo é garantir que eles recebam assistência social, tenham acesso à educação, etc. Essa disposição do governo italiano vem quando ocorre um seguido coro de lamentação sobre a crescente presença, na Itália, desse grupo humano que tem como pátria o mundo. Pelo fato de não estarem organizados em um estado, poucos sabem que as experiências nazistas para depuração da humanidade e grantir o domínio da “raça ariana” começaram com massacre dos ciganos. Essa busca de soluções para problemas que indicam controle do estado sobre os indivíduos deve sempre gerar preocupações. Quase sempre os grupos que estão fora dos espaços do poder sofrem as conseqüências dessas boas intenções. Evidente é que os que estão no poder também sofrem as conseqüências, mas não as negativas.

O processo de globalização permanente ao qual estamos submetidos, influenciando nele e dele sendo influenciado, exige de nós um comportamento mais atento sobre o que ocorre ao nosso redor. A cada momento recebemos milhares de informações e não nos permitem tempo para absorvê-las. Esse sistema informativo nos coloca para correr atrás de objetivos que não nasceram de nossas ansiedades mais íntimas, ao mesmo tempo em que somos forçados a assumir objetivos gerados em salas de “criação” de alguma agência ou escritório de assessoria a alguma empresa. Assim é que ficamos assistindo os nossos governantes buscando alianças para ganhar tempo de televisão na próxima campanha política, enquanto deveriam estar discutindo o que fazer para melhorar as vidas dos moradores das ruas, quer possuam teto ou não. Tudo parece tão normal, tão natural, que nem discutimos a ausência de espaço nas delegacias que atende os “criminosos comuns” enquanto prisioneiros na agência centro da Polícia Federal recebem comida enviada por seus familiares, entregues por advogados bem vestidos e bem nutridos. Apenas somos informados e não somos chamados – e não nos chamamos – para discutir o que se passa e o que significa isso. É natural, sempre foi assim, nos dizem.

Ora, não é natural, nem sempre foi assim e devemos agir para que não continue sendo assim.

Tudo é hoje um espetáculo, nos dizem. Mas, o que significa que algo é um espetáculo, e o que siginifica fazer parte de um espetáculo é o que precisamos saber. Mas esse saber não pode ser apenas racional, ele deve ser vital em todos os pedaços do nosso ser. Quando o saber é só racional ou é só emocional ele pode se tornar reacionário.

Em um espetáculo há vários agentes: idealizador (es), diretor (es), produtor (es), artista (s), maquiador (es), iluminador (es), público, etc. Precisamos saber qual a função que estamos exercendo nesse espetáculo de nossas vidas. Esse foi o tema de um filme, já não tão recente, sobre a vida de um homem que, sem saber esteve sempre sobre os holofotes e fazia parte de uma telenovela. A sua vida era um novela, mas ele não era o diretor. Entretanto tudo dava certo para ele. E tudo começou dar errado quando ele começou a se inquietar e querer ser o seu diretor. Há sempre a possibilidade de inquietação. Não ficar quietos.

Fomos ao cinema, vimos o filme, o achamos interessante e continuamos a nossa parte, continuamos a ser Truman. Ou ciganos, candidatos a receber uma identidade para que o estado possa controlar melhor a nossa existência. Aliás, vem aí uma nova Carteira de Identidade que, já se diz, há de nos garantir melhor proteção.

Na sociedade espetacularizada, só devemos nos mexer, não nos inquietarmos.

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