segunda-feira, maio 26, 2008

contador de histórias

É do saber de todos que acompanham este blog que estou participando, como um dito assessor pedagógico, do Ponto de Cultura Estrela de Ouro de Aliança. Os pontos de cultura existem em todo o país, sendo um programa do Ministério da Cultura. Tal programa se propõe a animar os lugares e as pessoas que sempre produziram cultura neste imenso país, mas jamais contaram com apoios oficiais. Esses lugares, para onde convergiam os mais pobres com o objetivo de buscarem diversão e, um pouco sem saber, manterem as tradições de seus avós. Ora, à medida que o programa avançava, apareceram problemas que seus idealizadores não imaginaram. Como era um programa em que o governo federal estava colocando dinheiro, muita gente começou a inventar ponto de cultura. Esse foi um deles. Outro problema é que a cultura que os pontos de cultura sempre cultivaram, era uma cultura dos iletrados, mas para poder participar dos incentivos ofertados pelo governo federal, era necessário preencher uma porção de questionários, fazer planilhas de custos, etc. Apenas os pontos de cultura que por sorte encontraram alguma assessoria puderam logo entrar no programa governamental. Esses são alguns problemas de ordem prática que podem e vêm sendo resolvidos. Mas há outros problemas.

A cultura brasileira é formada por diversas matrizes culturais, étnicas e religiosas.

Uma matriz juntou dinheiro, religiosidade, poder de armas e passou a comandar outras matrizes. Essa matriz é dominantemente européia e, embora mestiça nas suas origens, tem sido classificada como branca e predominantemente católica. Mas nem todos os brancos são católicos, nem todos os brancos são ricos. Há brancos pobres, há brancos menos brancos por seus antepassados terem se relacionado sexualmente com índios e ou com negros, além de terem se relacionados com os já mestiços, pois esses se fizeram desde as primeiras décadas da ocupação e colonização portuguesa. Há brancos praticantes das diferentes Umbandas, dos diferentes Espiritismos, há brancos ateus (se bem que esses são poucos encontrados entre os mais pobres, indiferente da sua pigmentação).

Além dos brancos há os negros. E nós sabemos que nem todos os negros são pobres, embora entre os pobres haja muitos negros e mestiços de negros, uma vez que não dá para pensar que, os homens e as mulheres negras tenham, no passado e no presente, escolhido preferencialmente outro negro ou negra para dar alegrar a sua vida sexual Alguns há que são ricos, e não de fortuna recente. Também pode ser dito que eles ficaram um pouco branco, pois à medida que foram enriquecendo, as gerações foram mantendo relações com brancos, estes talvez em processo de empobrecimento. E há negros que estão saindo da pobreza e vivendo na classe média. Também há negros que são católicos, negros que são Reformados (batistas, luteranos, anglicanos, presbiterianos) Evangélicos (Assembléia de Deus, Brasil para Cristo, Deus é Amor, Evangelho Quadrangular, etc.). Já tem negros vivendo na religiosidade Mórmon e há muitos seguidores da Igreja Universal do Reino de Deus. E podemos encontrar negros entre as Testemunhas de Jeová. Ou seja, nem todos os negros – pobres ou ricos – são cultuadores dos Orixás.

O primeiro grupo que viveu no Brasil, quase sempre deixado para o fim, é nativo, o índio. Ele poderia ser classificado de amarelo, embora sua cor seja variável, tanto hoje quanto no passado. Esse grupo foi totalmente alijado do projeto social que formou o Brasil. Mas ele está presente e, há os que vivem nas florestas, sob a supervisão (proteção, talvez) tanto do governo qaunto de missionários católicos ou protestantes em entre esses, há os de diversos matizes. Mas além desses que vivem distante (fisicamente) do mundo dos “brancos” (parece que para os índios quem não é índio é brancos, não importa a matiz que colore a epiderme), tem os que vivem em contato mais direto com o mundo da cultura civilizada. Esses estão enculturados e formaram o que se chamou até pouco tempo de caboclo. Mas esses têm sua religião que é dupla, eles são cristãos e mantém as crenças que cultivam desde antes dos portugueses virem com os seus deuses e os negros escravizados também viessem com suas fés. Grande parte desses caboclos está ligada à Jurema, aos deuses das suas matas, e dividem as suas matas com os deuses que vieram das savanas e das florestas africanas.

Eu não sei, mas deve haver ponto de cultura nas regiões de colonização polonesa, alemã, italiana, japonesa. São tantos os pontos de cultura não oficiais!!!!

Mas tudo isso é para dizer minha inquietação sobre a Ação Griô, a dos contadores de histórias. Da África vieram os contadores, embora aqui o que não falte é contador de história, da história do seu lugar. Em um país de analfabeto as histórias são contadas, não são escritas. E o que é mais interessante é que quando se conta uma história se passa uma cultura. Fico pensando a razão de uma metodologia africana, se eu sei que com a metodologia vem o conjunto da cultura. Fico pensando como seria interessante utilizar as metodologias aqui foram criadas, porque assim as a gente – eu e a nossa gente – veria que um povo que surgiu em luta de quinhentos anos já tem alguma coisa para ensinar.

Outro dia fiquei encantado com um escocês que estava encantado com o jeito de viver e ensinar cultura nos canaviais. Tinha de tudo, tinha de todos. Todos os santos, todos os anjos, todos os deuses, os deuses protetores, os que aconselham, os que curam, os que limpam as estradas, os que fecham os caminhos. Havia um acolhimento sem exclusão, sem imposição. Sentiu-se em casa.

Em tempo: programas governamentais não devem promover qualquer religião, pois o Estado é Laico.

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