quarta-feira, abril 04, 2007

Espetáculos de fé - Fogaréus e paixões

Esta Quarta Feira das Trevas, como todas as demais, tráz motivos para lembranças e reflexões.

Não há, no cerimonial católico, rito especial para este dia. A tradição, a religiosidade do povo veio a criar manifestações específicas para esse dia, ou essa noite. Essa noite de trevas é como uma preparação para a grave escuridão da noite seguinte, quando a liturgia, a religiosidade oficial, celebra a Ceia e a prisão de Jesus. A Quinta Feira Santa, o dia da Eucaristia, é dominada pela ação do clero. Logo pela manhã, o bispo local celebra a Missa dos Óleos, na qual todos os sacerdotes celebram em torno do bispo e renovam as promoessas feitas no dia em que foram ordenados. É cerimônia do clero, dos consagrados. À tarde ocorre a ceromônia do Lava-pés, para lembrar a necessidade da humildade. "assim como eu fiz, façam vocês". Essa é uma cerimônia para lembrar que todos devem ser humildes, inclusive os "separados", o clero. Depois, um dos que estavam na mesa saiu para "fazer o que tinha que ser feito".

A Quarta Feira não há cerimônia especial. Há um vazio, há uma expectativa sobre os acontecimentos do dia seguinte. O que ocorre em torno daquela mesa, os sentimentos que um discurso de despida causa, além da promessa de que nãoa ocorrerá a solidão dos desperados, ainda que em meio à desesperança. Mas, o vazio da Quarta Feira terminou por ser ocupado pela criatividade dos cristãos comuns. alguns deles se penitenciam na noite, no escuro das trevas. Outros criaram uma encenação que não poderia ser feita na Quinta Feira, pois aquele dia é um dia de reflexão sobre o abandono, o medo, a entrega, a fé. Mas alguns resolveram fazer essa reflexão mais visual, pois não possuiam o dom da palavra. No meio das Trevas, quando o medo, a apreensão se torna mais forte, luzes apontam o caminho que os soldados irão percorrer para dar continuidade ao drama daquele que irá ser preso.

No período colonial brasileiro, quando os portugueses ainda mandavam nessas terras, havia a procissão das trevas, em alguns lugares, a Procissão do Fogareu. Praticamente extinta, essa tradição se manteve apenas no Brasil Central, nos sertões do Brasil. Mas, nos dias de hoje, tudo é espetáculo, inclusive a fé. Não que as procissões de antanho não houvessem sido espetaculares, pois o Padre Carapuceiro vivia a reclamar desses espetáculos que ocorriam no Recife do sécuo XIX. Mas o espetáculo parecia ser secundário. Hoje tudo há que ser de tal forma que atraia multidões, faça as pessoas sairem do seu diário para o extra-ordinário. A Procissão do Fogaréu tornou-se um "espetáculo de fé", não mais um "ato de fé", como se dizia antigamente. Assim, Olinda que tem um espetáculo, que é um espetáculo durante o carnaval, e não mais consegue que as suas procissões tardicionais da Semana Santa sejam um espetáculo capaz de concorrer com o espetáculo da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, este ano iniciará a Procissão do Fogareu.

Um novo espetáculo de fé, anunciado por emissora de televisão.

Nenhum comentário: