sábado, março 24, 2007

As Leis Sangrentas e o parto da modernidade

Este é o último dos trabalhos apresentados pelos alunos da disciplina Moderna 2 no ano de 2006. Foi escrito e apresentado em sala po Clara Angélica, Cláudio Antonio de Andrade Filho, João Paul e Jonas Correia.

CÓDIGOS DE TRABALHO E O PARTO DA MODERNIDADE: LEIS SANGRENTAS OU QUESTÃO SOCIAL?


1. Montesquieu e seu “O espírito das leis”: uma visão iluminista.
A compreensão das leis sangrentas parte necessariamente da definição de lei, tal qual era entendida no contexto histórico. Para isso, para a perfeita compreensão do trabalho, partimos da definição de lei realizada por um iluminista, o Barão de Montesquieu.
Para o autor, as leis são todas as relações imutávies inerentes a todas as coisas, presentes tanto nos animais quanto nas pessoas, bem como nas realções entre estes e aqueles, e estabelecidas em função de uma razão primitiva. São regras invariáveis, uniformes e constantes estipuladas por Deus.
Ao criarem suas próprias leis os homens se relacionavam dentro do possível, controlam o mundo inteligente, ou seja, a justiça era a justiça possível. Apenas com o advento das leis formuladas é que se estabelece o conceito de justo e injusto conforme a ordem jurídica existente. Assim, esse mundo fica aquém do mundo físico, uma vez que a constância das relações é estabelecida pelos seres humanos, portanto passíveis ao erro. Ademais os seres humanos além de alterarem as leis que eles próprios estabeleceram para se governarem, violam as leis criadas por Deus.
O autor divide as leis em: leis da natureza e leis positivas. As primeiras tem como origem a constituição do próprio ser, o homem visto individualmente, antes de sua inserção em uma dada sociedade. Essa espécie de lei nos remete a Deus, é o homem visto no estado de natureza, governado apenas pelas leis divinas. Todos são inferiores e fracos e, exatamente por isso, se sentem iguais aos outros, assumindo uma postura de defesa em busca da paz, considerada a primeira lei natural. Em seguida encontramos a busca de alimentação. Por temor recíproco dos outros, tendem a se unir, bem como pela atração do sexo oposto (terceira lei natural). Por fim, a inteligência inata ao ser humano desperta um sentimento ausente nos animais: o desejo de viver em sociedade, sendo essa a quarta lei natural.
As leis positivas surgem depois que o homem está organizado em sociedade, perdendo o sentimento de fraqueza e de igualdade, instaurando, assim, o estado de guerra. Surge, paulatinamente o sentimento nacionalista, ressaltando a força de cada sociedade, por seu turno, os particulares também se sentem fortes, criando um estado de guerra interno. Diante dessa realidade decorre a necessidade da criação de leis positivas que vão reger o viver social e apaziguar as relações entre os homens.
Assim, é criado o Direito das Gentes, a fim de regular as relações entre as diferentes nações soberanas; o Direito Político, responsável pelo estabelecimento da ordem entre aqueles que governam e os que são governados; e o Direito Civil, tocando regular as relações entre os particulares.
Montesquieu procura examinar o Espírito das leis e não as leis positivas da sociedade em que vive. As relações existentes entre si, quanto a sua origem, com o objetivo do legislador e quanto à ordem das coisas sobre as quais foram estabelecidas.
Em seu livro, O Espírito das Leis, tratou não apenas das leis das nações, mas também das espécies de governos, inovando por dividi-las e limitá-las. Ainda que antiga a divisão dos governos em três espécies, Montesquieu não limitou-se a diferenciá-los numericamente, a partir do número de pessoas que compunhas o poder, porém analisou a estrutura e o funcionamento de cada um deles.
Três são as espécies de governo: o Republicano, o Monárquico e o Despótico. A identificação da natureza de cada regime parte da idéia que o povo forma de seu próprio regime e pode ser assim definida: “o governo republicano é aquele no qual o povo em seu conjunto, ou apenas uma parte do povo, possui o poder soberano; o monárquico, aquele onde um só governa, mas através de leis fixas e estabelecidas; ao passo que, no despótico, um só, sem lei e sem regra, impõe tudo por força de sua vontade e de seus caprichos”[1].
A monarquia é dividida, se considerarmos a divisão tradicional, no Espírito das Leis existe a monarquia limitada, alvo de elogios, e o despotismo, para quem são rendidas muitas críticas. A república, por seu turno é subdividida em aristocrática ou democrática.
Revela o autor que, para cada forma de governo a um sentimento comum entre as pessoas que conferem legitimidade à estrutura e ao governo, algo que todos sintam e que seja responsável pela pacificação, uma paixão: na república, rege a virtude; na monarquia, a honra; já no despotismo, os homens estão sob o império do temor. Nesse sentido, Montesquieu difere de outros iluministas da época, como Rousseau, Locke e Hobbes, pois não defende a origem contratualista do Estado.
Concebeu Montesquieu a Teoria da Separação dos Poderes, cujo objetivo primordial era a afirmação da liberdade dos indivíduos. A liberdade política consiste em “poder fazer o que se deve querer e em não ser forçado a fazer o que não se tem o direito de fazer”[2], ou seja tem-se liberdade no momento em que se pode fazer tudo o que é permitido por lei.
No momento em que todas as funções do Estado eram concentradas em uma só pessoa, ou em um só corpo, não há liberdade, pois o comando total está nas mãos de um só ente, que pode criar leis tirânicas e executá-las de forma tirânica. A liberdade é encontrada em regimes em que o poder limite o próprio poder, apenas assim o cidadão não temerá o outro e sentirá segurança e tranqüilidade no Estado.
Segundo o autor, três são os tipos de poder: o poder legislativo, o poder executivo (propriamente dito) e o poder judiciário (ou de julgar ou poder executivo das coisas que dependem do direito civil).
No poder legislativo há a prerrogativa de elaboração das leis e correção ou anulação das que não mais vigem. O poder executivo é reposnável pela paz e pela guerra. Já ao terceiro poder atribui-se a função de julgar os conflitos de interesses entre os particulares e punir as condutas definidas como crimes.
O autor analisa que a maioria dos reinos europeus estão sob a égide de regimes moderados, que permites a liberdade dos indivíduos. Vale ressaltar que próprio autor considera que a democracia e a aristocracia não são regimes moderados, portanto não permitem a liberdade. Para ele, moderados são os regimes em que os dois primeiros poderes se concentram nas mãos do príncipe e apenas o poder de julgar é atribuído aos súditos. Países como a Turquia e as repúblicas da Itália concentram todos os poderes, possuindo menos liberdade que os demais.
O poder de julgar deve ser concedido ao povo, para que os homens sejam julgados por seus pares, exercido temporariamente e em um momento do ano, na forma da lei, bem como adstrito aos preceitos legais, tal como ocorria em Atenas. Os outros dois, por outro lado, poderia ser exercidos legitimamente pelo soberano, posto que não são exercidos sobre os particulares, constituem, na verdade, a vontade do Estado (poder legislativo), e a execução dessa vonatede (poder executivo).
Defende que o poder legislativo será confiado a um corpo de nobres e a um corpo de representantes do povo, com assembléias específicas e deliberações próprias. O exercício é através de representantes do povo, e não pelo próprio povo, uma vez que estes não são capazes que discutir todos os assuntos.
Esses representantes não devem ouvir as necessidades diretas dos representados, para evitar demoras internináveis e discussões que não levam a nada. O povo só participa para escolher seus representantes, “exceto aqueles que estão em tal estado de baixeza, que se considera que não tem vontade própria”[3]. Os legisladores devem apenas criar as leis, não lhes é dada a prerrogativa de executá-las.
O poder executivo deve está concentrado nas mãos de uma só pessoa, de preferência o monarca, para que as decisões sejam rapidamente tomadas, ao contrário de um corpo onde as questões necessitam de deliberações. O poder executivo deve ser exercido por pessoa diversa do legislativo a fim de permitir a plena liberdade.
Dentre suas prerrogativas, o poder executivo deve ter o direito de limitar o poder legislativo, sob pena de o tornar despótico a anular a ação dos demais poderes. Todavia a recíproca não é verdadeira, ou seja, não pode o legislativo frear a ação do executivo, ainda assim possui a faculdade de examinar a aplicação das leis que criou.
O poder de julgar, por sua vez, deve ser conferido aos pares dos julgados, assim, existem os tribunais ordinários, para julgar as pessoas comuns, enquanto que os nobres são levados à parte do corpo legislativo composta de nobres. Como anota o próprio autor, ao julgador não é necessária a busca pela justiça, mas deve está adstrito unicamente à letra da lei.
Assim, o governo ideal seria aquele que congregasse os três poderes separadamente, permitindo a liberdade dos indivíduos do corpo social. Procura afirmar a soberania do poder do monarca, considerando o regime ideal, uma monarquia limitada, onde o monarca representa o poder executivo, possuindo um corpo legislativo e órgãos julgadores. A democracia não permitia a liberdade, uma vez que atribui ao povo às funções do Estado. Analisou a sociedade de sua época aos olhos de um nobre e para a manutenção do poder dos nobres pautou sua obra.
2. Hugo Grotius, protestantismo, capitalismo e guerra justa: sementes da soberania.
A partir do momento em que se criaram leis nacionais adotando as especificidades de cada cultura e local, passou a se desenvolver um conceito de nação e, conseqüentemente, de soberania. O conceito de soberania foi desenvolvido principalmente por Hugo Grotius, em seu trabalho Mare Liberum.
Tal escrito discute os direitos de Inglaterra, Espanha e Portugal a governar os mares. Se tais países pudessem legitimamente governar e dominar os mares, os holandeses estariam impedidos de navegar às Índias Ocidentais. O argumento de Grotius é que a liberdade dos mares era um aspecto primordial na comunicação entre os povos e nações. Nenhum país pode monopolizar o controle do oceano dada sua imensidade e falta de limites estabelecidos. Como exemplo afirma que Portugal não possuía soberania sobre as Índias Orientais, uma vez que esses povos “possuem hoje e sempre possuíram seu próprio rei, seu próprio governo, suas próprias leis, e seu próprio sistema legal”[4], continua dizendo que o que Portugal possuía era o direito de comercializar com esses povos como quaisquer outros, posto que lhes foi conferido pelos próprios habitantes seguindo as leis locais, os Portugueses, portanto são estrangeiros e não soberanos.
Dessa forma, para ser soberania não é recompensa por descobrimento, tampouco é mensurável pelo alcance dos olhos, pressupõe, antes de tudo, verdadeira e atual posse. Questiona como seria possível aos portugueses tivessem sequer descoberto a Índia, conquanto se trata de uma cultura milenar, conhecida desde os tempos dos Romanos.
Também não se mostra válida qualquer doação de soberania realizada por qualquer poder religioso[5]. Tampouco será conquistada a título de guerra ou descobrimento, salvo se presente a ocupação como pré-requisito (posse efetiva). Bem como não é decorrente de práticas costumeiras.
Critica as conquistas realizadas em nome da conversão para a fé, uma vez que a soberania está ligada à idéia de leis positivas e não ao direito divino, afirmando que nem no Antigo Testamento quando as terras eram obtidas por força das armas, se subjugavam os perdedores à conversão para a fé dos vencedores.
Qualquer Nação terá jurisdição sobre os mares, pois este é tanto considerado como pertencente a ninguém como coisa pública ao mesmo tempo. Declara que os mares são abertos a todos e a ninguém pertencem soberanamente, são produzidos pela natureza e a ninguém podem pertencer, fala-se apenas em soberania dos portos marinhos.
Resume dizendo que com as leis nacionais, foi introduzido o princípio da possibilidade de comercialização, direito o qual ninguém pode ser privado e que significa uma libertação para a Nação. O direito de comércio é um direito primitivo e natural de todas as Nações que não pode ser destruído. Esse direito de comércio é conquistado pela paz, por Tratado ou por guerra.
A partir do momento que esse direito se coletiviza, se tornando o direito da Nação e não o direito de o particular praticar o comércio, surge o sentimento de nacionalismo e dele decorre a soberania.
Um dos teóricos do direito natural do século XVI tardio e início do século XVII, Hugo Grotius definiu o direito natural como um julgamento perceptivo no qual as coisas são boas ou más por sua própria natureza. Com isso rompia com os ideais calvinistas pois Deus não mais seria a única fonte ou origem de qualidades éticas. Tais coisas que por sua própria natureza eram boas estavam associadas com a natureza do Homem. Ora, a República Holandesa tinha sido fundada com base em princípios de tolerância religiosa, mas se tinha tornado uma teocracia calvinista. Como humanista e patriota holandês, Grotius teve problemas com o calvinismo.
Tais disputas diziam respeito a leis internacionais da guerra e a questões de paz e justiça. Sua posição era contrária à predestinação e o Calvinismo e defendia a causa do livre arbítrio. Não deixou de argumentar mesmo em público que o Calvinismo poderia acarretar perigos políticos e religiosos para o Protestantismo em geral. Tentou imaginar uma fórmula para a paz que não chocasse contra o Calvinismo, mas falhou e acabou até preso.
Segundo ele, todo direito devia ser dividido entre o que é divino e o que é humano. Distingue entre as leis primárias e as leis secundárias da Natureza. As primeiras são leis que expressam completamente a vontade divina. As segundas são leis e regras dentro do âmbito da razão. Grotius discute a Guerra como modo de proteger os direitos e punir os erros. É uma dos modos do procedimento judicial. Embora a guerra possa ser considerada um mal necessário, é necessário que seja regulada. A guerra justa, aos olhos de Grotius, é uma guerra para obter um direito. Discute três meios de se resolver uma disputa pacificamente: o primeiro é a conferência e a negociação entre dois rivais ou contestantes. O segundo método é chamado compromisso ou um acordo em que cada um dos lados abandona certas exigências e faz concessões. O terceiro é por combate ou por tirar a sorte. Para Grotius, seria melhor por vezes renunciar a alguns direitos do que tentar exigi-los pela força. No que se refere a barganha e mediação, sustenta que em cada um dos métodos acima é da maior importância escolher um juiz com caráter e decência. Discute os métodos de conseguir paz e no final obter alguma forma de justice, e diz: «Porque a justiça traz paz de consciência enquanto a injustiça causa tormento e angústia… A justiça é aprovada, e a injustiça condenada, pela concordância comum dos homens bons.» (Prolegomena)
Para Grotius as leis morais deviam se aplicar tanto ao indivíduo quanto ao Estado. Embora fosse conservador em suas opiniões, suas idéias sobre Guerra, conquista e a lei da natureza continuaram a ser bem consideradas e expandidas por filósofos mais liberais como John Locke em seus Two Treatises on Civil Government (1689). Locke concorda com Grotius ao usar o artifício analítico de um estado da natureza existente antes do governo civil e ao declarar que o poder e a força não criam direito e ainda que guerras justas têm por finalidade preservar direitos.
Grotius ajudou a formar o conceito de sociedade internacional, uma comunidade ligada pela noção de que Estados e seus governantes tem leis que se aplicam a eles. Todos os homens e as nações estão sujeitos ao Direito internacional e a comunidade internacional se mantém coesa por um acordos escritos e costumes.
3. Vocação: a divisão do trabalho segundo a ética protestante.
Pode-se dizer que entre os estudantes universitários ou especificamente entre os acadêmicos das ciências humanas, é quase unânime uma visão política de esquerda. Esta visão por vezes extremada, traz implícita uma concepção do capitalismo que o identifica como desejo de aquisição de bens temporais desenfreada, fazendo apologia a animalidade humana. Isto traz a tona a importância das reflexões de que Max Weber faz inicialmente em “A ética protestante e o espírito do capitalismo”. Assim como ele, antes que iniciemos faz-se necessário um breve apanhado sobre a noção desta que é “a força mais significativa de nossa vida moderna”.
Para Weber, a superação desta noção ingênua de capitalismo faz parte do jardim de infância da história cultural. Primeiramente estabelece a ação econômica capitalista como aquela baseada expectativa de lucro mediante a utilização das oportunidades de troca. Este tipo de ação esteve presente nas mais diversas culturas desde a antiguidade. Arrolando várias distinções entre ocidente e oriente, demonstra a peculiar forma de desenvolvimento da cultura ocidental, intrinsecamente baseada na racionalidade tanto na ciência quanto na arte. Sendo esta racionalidade originadora também da forma peculiar do capitalismo ocidental e do surgimento na era moderna e ira culminar na organização capitalista racional do trabalho livre.
Defende que, em si, este capitalismo não se identifica com um impulso irracional para a aquisição ou a ânsia do lucro desenfreada. No entanto, dentro de uma ordem social totalmente capitalista, equivale à procura de um lucro sempre renovado. É então que, buscando as raízes culturas históricas deste sóbrio capitalismo burguês que Weber encontrará o que chamou de “Espírito do Capitalismo”. Ou seja, as implicações psicológicas da avaliação religiosa do infatigável, constante e sistemático labor vocacional secular, como o mais alto instrumento de ascese,e, ao mesmo tempo, como o mais seguro meio de prova da redenção da fé e do homem. A mais poderosa alavanca desta concepção de vida. Certamente deste ascetismo posteriormente laico provem muitos dos valores de nossa cultura ocidental.
Desta forma entendo eu que a atual forma de capitalismo representa uma corrupção generalizante do espírito capitalista.
Fé que gerou grandes lutas políticas e culturais durante os séculos XVI e XVII o calvinismo foi adotado nos paises capitalistas mais desenvolvidos – Inglaterra, França e Holanda. A doutrina da predestinação é considerada seu dogma mais característico. A diferença decisiva entre o catolicismo e o calvinismo era a completa eliminação da salvação através da igreja e dos sacramentos, juntamente com toda a mística ritual da liturgia católica. Não havia meios de obter a graça de deus, uma vez que seus desígnios não podiam mudar. Portanto a graça era tão impossível de ser perdida por aqueles a quem ele a concedeu como era inatingível para aqueles aos quais ele a negou. Os membros da igreja externa(católica) incluíam os condenados, e deveriam seguir sua disciplina apenas pela glória de Deus. Porém nunca poderiam integrar seus eleitos.
Outra das principais características do calvinismo é a total transcendência divina, em sua concepção, aplicar padrões de justiça terrena aos desígnios divinos é “desprovido de sentido e é um insulto a sua majestade, uma vez que ele e apenas ele, é livre, não esta submetido a lei nenhuma. Seus desígnios só podem ser entendidos ou mesmo conhecidos por nos na medida em que seja de seu agrado nos revelar". Em contraste com o luteranismo. Os meios de uma libertação periódica do pecado foram abolidos com o desaparecimento da confissão, só Deus podia ser o confidente, só nele havia confiança. Somando a concepção de “total transcendência divina” com a corrupção de tudo que se refere à matéria estava formada a idéia do Puritanismo, que relegava o individuo a uma solidão interna própria do individualismo burguês. Weber aponta que estes dogmas criaram um individualismo de tendência pessimista que perdurou nas nações de passado puritano.
O “Amor ao próximo” do calvinista, estava relacionado ao serviço em propósito do bem estar social, neste serviço continha as obras do mandamento cristão só que assumindo um caráter impessoal. A validade da fé, ou seja, a certeza da graça pela perseverança apontada por Calvino era difícil para os fiéis. Para afugentar as dúvidas e tentações do demônio, que suscitavam a incerteza da graça do fiel, intensa atividade secular(trabalho) era recomendada. Em oposição ao humilde pecador que, para Lutero obteria a graça através da penitencia, o calvinismo criava o que weber chamou de “santos autoconfiantes”.
A busca da chamada unio mystica (União mística), um sentimento real de absorção da divindade, constitui a maior aspiração religiosa do Luteranismo. Juntamente com o sentimento de indignação para com o pecado original, é fundamental para estabelecer a penitencia quotidiana. Calvino repudiava essa piedade emocional puramente interior do luteranismo, alem da total transcendência divina ser incompatível com uma real absorção da divindade na alma humana. Nestas duas religiões o crente podia portanto certificar-se de seu estado de graça tanto sentindo-se o receptáculo do espírito santo, como o instrumento da vontade divida. Sendo o primeiro próprio do luteranismo e o segundo do calvinismo.
Baseado no puritanismo inglês, As Teorias de Richard Baxter (mais importante teórico puritano, capelão do exercito de Cromwell) – que propunha um abrandamento do calvinismo quanto a doutrina da predestinação – são a principal base da argumentação weberiana quanto a este tópico.
Baxter faz considerações sobre a riqueza afirmando “suas tentações nunca cessam, sua procura é desprovida de sentido se comparada a superior importância do reino de Deus além de moralmente suspeita”. A ascese, parece aqui voltar-se, com veemência, contra a riqueza de bens temporais. Calvino não via na riqueza do clero obstáculo a sua eficiência, pelo contrario, melhorando sua reputação.
Porem a verdadeira crítica recai sobre o relaxamento e os vícios trazidos com a riqueza, ócio e sensualidade, e da possibilidade do abandono da busca de uma vida santificada baseada no trabalho ascético. “A perda de tempo, portanto, é o primeiro e o principal de todos os pecados(...) conversa ociosas, sono alem do necessário, é absolutamente condenável do ponto de vista moral(...) de toda hora perdida de trabalho redunda uma perda de trabalho para a glorificação de Deus” (Weber. Pág 86.). Parte daí uma pregação constante contra a contemplação passiva prejudicial ao trabalho cotidiano tão agradável a Deus e a favor da materialização de sua vontade no trabalho. O trabalho é um velho e experimenta instrumento ascético, preventivo contra todas as tentações de uma vida desonesta.
A falta de vontade de trabalhar é chega a ser considerada um sinônimo da ausência do estado de graça. Em contraste com a posição medieval na interpretação de tomas de Aquino, a frase “Quem não trabalha não deve comer” aqui é incondicionalmente válida para cada individuo. Na teologia medieval o trabalho era considerado necessário para o sustento, e caso houvesse possibilidade, a contemplação era estimulada como forma espiritual de trabalho.
Tudo isto estava baseado na doutrina onde era prescrito “Trabalha energicamente na tua vocação”, trabalhar o dia todo em prol do que lhe foi destinado de acordo com a inequívoca manifestação da vontade de Deus através da vocação, que deve ser além de exercida, professada.
A divisão dos homens em classes e profissões tornou-se para Lutero um resultado direto da vontade divina, e, conseqüentemente, a permanência de cada um na posição e exerce-la dentro dos limites que lhe forma assinalados por deus era um dever religioso. Portanto prosseguir na vocação escolhida era identificado com a providencia divina.
A vocação puritana se distingue da luterana, onde não é um destino ao qual se submeter, mas um mandamento, resultando em amplas conseqüências de ordem econômica. Nesta a divisão do trabalho se conhece pelos seus resultados. Neste ponto as considerações de Baxter se assemelham com as de Adam Smith “A especialização das ocupações leva, a medida que possibilita o desenvolvimento das habilidade do trabalhador, a progressos quantitativos e qualitativos na produção, servindo assim também ao bem comum, que é idêntico ao bem de maior numero”.
As restrições impostas ao uso da riqueza so poderiam levar ao seu uso produtivo como investimento de capital. O puritano queria tornar-se um profissional que deveria fazer “o melhor nesta tanto quanto na outra”. Quando a ascetismo foi levado para fora dos mosteiros passando a influencia a moralidade da vida secular, contribuiu poderosamente para a formação da moderna ordem econômica. Desde que o ascetismo começou a remodelar o mundo e a nele se desenvolver, os bens materiais foram assumindo uma crescente e inexorável força sobre os homens, como nunca antes na historia.
À organização social orgânica, do tipo fiscal-monopolista, adotada pelo anglicanismo sob os Stuarts, notadamente nas concepções de Laud – ou seja, a essa ligação do Estado e da Igreja com os monopolistas, fundamentada numa ética social cristã – opunha o calvinismo, cujos representantes eram os mais ferrenhos opositores desse capitalismo de comerciantes privilegiados pela Coroa e de empresários colonialistas, os motivos individualista da aquisição racional e legal através da habilidade e da iniciativa de cada um, que – enquanto as empresas monopolistas politicamente privilegiadas da Inglaterra não tardaram a desaparecer – teve uma parte ponderável e decisiva no desenvolvimento industrial que se deu apesar da, e contra a, autoridade do Estado. Os puritanos(Prynne, Parker) condenaram toda relação com os “cortesãos e planejadores” de cunho capitalista, uma classe eticamente suspeita, porem orgulhavam-se de sua própria ética comercial burguesa superior, que constitui a verdadeira razão das perseguições a que foram submetidos da parte daqueles círculos. Defoe prepôs o combate contra a dissidência através do boicote do credito bancário e de retirada dos depósitos bancários. A diferença entre os dois tipos de mentalidade capitalista freqüentemente acompanhava as divergências religiosas. Os opositores dos não-conformistas, até o século XVIII, ridicularizavam estes como portadores do espírito do comerciante e como causa da ruína dos ideais da velha Inglaterra. Nisto residia também a diferença entre a ética econômica puritana e a judaica, e já os seus contemporâneos sabiam estar na primeira, e não na segunda, a ética capitalista burguesa.
A ética social anglicana dos Stuarts se conservou próxima da posição medieval, onde além tolerada a mendicância que proporcionava aos homens de posse oportunidade fazer boas obras, e onde chegou a ser tratada com uma “classe”. Esteve reservada ao ascetismo puritano a ativa participação na elaboração da dura legislação dos pobres, que fundamentalmente alterou a situação da Inglaterra. pode fazê-lo porque as seitas protestantes e as comunidades estritamente puritanas não chegaram a conhecer qualquer forma de mendicância em seu seio.

4. Europa, séculos XIV e XV: da expropriação ao disciplinamento forçado do trabalho assalariado.
"Nada suscitou nos homens tantas ignomínias como o ouro. É capaz de arruinar cidades, de expulsar os homens de seus lares; seduz e deturpa o espírito nobre dos justos, levando-os a ações abomináveis; ensina aos mortais os caminhos da astúcia e da perfídia, e os induz a cada obra amaldiçoada pelos deuses" - Sófocles, Antígona -
"- De onde veio sua riqueza? Meu pai deixou pra mim. E como seu pai a conseguiu? O pai dele deixou pra ele, que por sua vez conseguiu com o pai dele..."
Esta pequena fábula nos remete ao início da questão: quem foram os pais da atual elite burguesa e como eles conseguiram acumular riquezas em suas mãos? Ou seja, como surgiu o capitalismo?
Sabemos que a produção capitalista ocorre apenas quando os meios de produção encontram-se apropriados pelos capitalistas e há um grande contingente de mão-de-obra disponível cuja única alternativa para sobreviver é vender a sua força de trabalho.
As relações pré-capitalistas são predominantemente agrícolas, em cuja atividade está os principais meios de produção, entre eles a terra. Ora, a história da acumulação primitiva do capital constitui-se exatamente da expropriação desses meios de produção dos camponeses, criando, assim, a classe dos trabalhadores assalariados para o capital agrícola e industrial.
A base da transição do feudalismo ao capitalismo está nessa expropriação, que se realizou em toda a Europa Ocidental, evoluindo com as características próprias de acordo com a cultura e a vida cotidiana de das diferentes regiões.
Demonstrando esta mudança histórica através de uma análise na vida social da população inglesa nos séculos XIV e XV, que nesta época vivia principalmente no campo, Marx nos diz que os camponeses livres, aqueles que já não tinham nenhum laço de servidão com os senhores feudal e que já compunham, a partir do século XV, a grande maioria da população, foi expulsa de suas terras para dar lugar à criação de carneiros, de onde se obtinha a lã para as nascentes manufaturas. Assim, a nobreza inglesa, já com uma nova mentalidade sobre o poder do dinheiro, transformou todas as terras em cultivo para pastos de carneiros.
A Reforma Protestante também impulsionou a expropriação violenta dos camponeses, pois as terras confiscadas à Igreja Católica, a maior proprietária das terras inglesas, eram doadas ou vendidas pelos nobres aos burgueses ou arrendatários especuladores, que expulsavam os antigos colonos.
A acumulação primitiva teve também como uma de suas causas o roubo do "tesouro público". A partir da Revolução Gloriosa que levou ao poder Guilherme III, príncipe de Orange, Marx afirma que foi inaugurada uma "nova era com uma dilapidação verdadeiramente colossal do tesouro público. Os domínios do Estado, roubados até essa data com moderação, dentro dos limites da decência, foram extorquidos à viva força do rei adventício como compensação devidas aos seus antigos cúmplices, ou vendidos a preços irrisórios, ou enfim, sem formalidade alguma, anexadas a propriedades privadas. Tudo isso se fez a descoberto descaradamente, desprezando-se mesmo as aparências legais" (Marx, O capital).
A criação de um numeroso proletariado que se seguiu à expropriação dos camponeses era maior e mais rápida do que a sua absorção pelas manufaturas. Também a absorção, pelo proletariado, das novas relações de produção que era obrigado a enfrentar nas novas condições, essa absorção não estava clara em sua cabeça. Era necessário, pois, discipliná-lo para o trabalho assalariado e reprimir os que, por falta deste, tornavam-se mendigos ou ladrões.
Daí que se segue uma das mais violentas repressões disciplinadoras (a seguir à repressão expropriadora) de que se tem notícia na história da humanidade, pois a nova classe dominante tratava os trabalhadores – diz Marx – "como criminosos voluntários, supondo que dependia de seu livre arbítrio o continuar trabalhando como no passado e como se não tivesse sobrevindo nenhuma mudança em sua condição de existência".
Tornando claro esse processo histórico, Thomas Morus, em sua célebre obra Utopia, assim o descreve: "Assim sucede que um ávido e insaciável glutão (...) pode apoderar-se de milhões de acres de terras, cercando-as de estacas e postes ou atormentando seus proprietários com injustiças que os obriguem a vender-lhe tudo. De um modo ou de outro, era mister que abandonassem suas fazendas, todas estas pobres e simples pessoas, homens, mulheres, esposas, órfãos, viúvas e mães com seus filhos e todo o seu haver (...) Era necessário, digo, que arrastassem seus passos longe de seus antigos lares, sem encontrar um lugar de repouso. (...) E, vagando daqui para ali, tendo comido até o último centavo, que podiam fazer senão roubar, e então, santo Deus! Ser enforcado com todas as formalidades legais ou ir mendigar? E são ainda lançados nos cárceres porque levam uma vida errante e não trabalham, eles a quem ninguém no mundo quer dar trabalho, por solícitos que sejam, oferecendo-se para todo e qualquer gênero de serviços".
Assim, milhares de ingleses foram executados, açoitados, acorrentados, presos, tinha sua orelha amputada, a face marcada a ferro, podiam ser vendidos, alugados ou legados por testamento. Ainda não estou me referindo à escravidão dos negros da África, estou falando de uma opressão contra os trabalhadores da Europa! A estas leis que legalizavam a morte, a tortura e, em muitos casos, a condição de escravos aos trabalhadores europeus, contrariando até mesmo o "trabalho livre assalariado", Marx chamou de "a legislação sanguinária contra os expropriados".
A história também registra, nessa época, o massacre contra a infância, em que crianças a partir de 5 anos de idade trabalhavam no mínimo 16 horas todos os dias, não tendo direito a lazer, educação, férias ou descanso semanal.
Este foi, pois, o destino dos pais da atual classe trabalhadora, que os livros de história escondem, divulgando apenas as técnicas na produção e as descobertas científicas desse momento, além dos feitos dos reis e suas intrigas palacianas – a histórias dos "grandes homens", portanto.
Os ventos da acumulação primitiva trouxeram força e energia aos “moinhos satânicos”[6] do capitalismo. Os camponeses foram expropriados dos seus meios de produção pela burguesia e pela gentry, que, através de mecanismos de mercado e, principalmente, de coerção e violência, se apropriaram privadamente das terras comunais.
A expropriação dos meios de produção dos trabalhadores rurais ocorreu sob o signo da violência física e social patrocinada pelas classes dominantes e executada pelo Estado inglês. O objetivo da expropriação da terra não foi suprir as necessidades sociais dos trabalhadores, que a utilizavam como um meio de sustento próprio e da comunidade; os motivos eram econômicos, e passavam ao largo de considerações humanistas ou moralistas. As terras, então usadas na produção de meios de subsistência e do excedente econômico, começaram a ser utilizadas como pastos de ovelhas, fornecedoras de uma matéria-prima valorizada na época, a lã.
Pouco importava se a produção de alimentos iria decair, agravando ainda mais a fome em épocas de escassez, e os preços dos alimentos iriam aumentar num ritmo mais acelerado do que o dos salários. Outrossim, pouco importava se a expropriação das terras criaria uma enorme massa de desempregados, que, submetidos à coação econômica, seriam obrigados a migrar para as cidades em busca de emprego, não os encontrando, pois as manufaturas não geravam postos de trabalho em quantidade suficiente para absorver aquela legião de imigrantes rurais. E, para completar todo este processo de transformação social, os trabalhadores rurais, que porventura conseguiam um emprego nas cidades, ainda tinham que passar por mais uma barreira, a de adaptação ao ritmo e ao modo de produção da manufatura, distinto da cadência do trabalho na agricultura. Este foi, diga-se, o caso de milhares de trabalhadores.
Os trabalhadores, sem emprego ou que não se adaptaram à disciplina das manufaturas, tomaram uma legião de mendigos, vagabundos e ladrões. Este lúmpenproletariado foi ratado como pária da sociedade, como se eles houvessem escolhido viver como desempregados, pedindo esmola na rua e nas portas das igrejas e das casas de caridade. Os que insistem ficar de fora do novo contrato social, para retomarmos a visão clássica do liberalismo, em não vender e alienar o seu próprio corpo, a sua própria existência como uma mercadoria qualquer, pronta para o consumo do ato produtivo, são tidos como vagabundos e selvagens, excluídos da civilização. “A questão é como trazê-los para dentro, como fazê-los ingressar no social. Ou, no extremo oposto, como se livrar deles quando sua absorção se torna impossível” (BRESCIANI, 1984, p.81).
Se a ideologia conservadora da época retratava-os como indivíduos moralmente fracos, insolentes por natureza, o Estado lhes daria um tratamento muito mais firme, sempre apoiado nessa ideologia. O tratamento prescrito para combater esta nova forma de pobreza não foi combater as causas estruturais da pobreza – expropriação dos meios de produção, propriedade privada burguesa –, mas sim punir os pobres; em outras palavras, a “questão social” foi tratada com compaixão e misericórdia cristãs[7] e, no limite, como um caso de polícia.
No final do século XV e durante todo o XVI, surge, na Europa Ocidental, em especial na Inglaterra, uma legislação truculenta e repressiva contra a vadiagem. “Os ancestrais da classe trabalhadora atual foram punidos inicialmente por se transformarem em vagabundos e indigentes, transformação que lhes era imposta. A legislação os tratava como pessoas que escolhem propositalmente o caminho do crime, como se dependesse da vontade deles prosseguirem trabalhando nas velhas condições que não mais existiam” (MARX, 2003 [1867], p.848).
A legislação sanguinária contra os pobres começou na Inglaterra, no reinado de Henrique VII, e transcorreu os de Henrique VIII, Eduardo IV, Elizabeth e Jaime I, sendo que muitas das medidas promulgadas nesta época perduraram ao longo de mais de três séculos. Caso procurássemos alguns denominadores comuns a estas legislações contra os pobres, de tempos tão distintos (e distantes) uns dos outros, acharíamos três deles: (1) disciplinar a força de trabalho para o trabalho assalariado, (2) rebaixar o salário aquém do nível de subsistência e (3) impedir a organização coletiva dos trabalhadores.
O trabalho nas manufaturas, que começavam então a suplantar as corporações medievais, era muito diferente, sob diversos aspectos, do trabalho agrícola, tendo os camponeses expropriados estranhado[8] as suas novas condições de trabalho, isto sem falarmos no fato de terem de se vender como mercadorias. Muitos não se adaptaram a esta nova vida, ao ritmo de trabalho das produções domésticas e manufatureiras, e ficaram a vagar pelas ruas e becos das cidades. A mendicância foi o meio encontrado para sobreviverem neste ambiente hostil. Tão rápido a população de mendigos e vagabundos tornou-se abundante, e “perigosa”, o Estado, em defesa da ordem social, tomou iniciativas legais para, literalmente, disciplinar a força de trabalho a ferro e fogo[9].
Pessoas velhas e incapacitadas ao exercício de atividades laborais receberam licenças de mendicância. Indivíduos sadios, que se encontrassem fora dos processos de produção, sofreriam duras penas, desde açoites e mutilações até a pena de morte, podendo, inclusive, virar escravo daqueles que o denunciassem. Os asilos, responsáveis por abrigar os mendigos tornaram-se unidades de produção manufatureira, e as paróquias, casas de trabalhos forçados; a lógica era converter o vagabundo num trabalhador ativo, que produzisse para pagar a assistência social prestada a ele pelo Estado. Livres da servidão feudal e dos meios de produção, os trabalhadores, agora proletarizados, foram presos nos grilhões da escravatura moderna.
Tomadas estas medidas para forçar o trabalhador a ingressar nos novos processos de produção, tratava-se, em um instante ulterior, de regular os salários pagos a estes trabalhadores formalmente subsumidos ao capital. Nesta época da pré-história do capital, o montante dos rendimentos do trabalho era muito significativa se comparada em relação ao valor investido nas máquinas e equipamentos. O salário, portanto, deveria ser controlado ao máximo, para permanecer constantemente baixo, impedindo maiores danos aos lucros dos capitalistas.
Na Inglaterra, em 1349, foi promulgado o Estatuto dos Trabalhadores, uma legislação sobre o trabalho assalariado que estabelecia um limite máximo da remuneração dos trabalhadores, mas não um mínimo[10]; ou seja, criava-se um teto, e deixava o piso em aberto. Os patrões, segundo estas mesmas leis[11], também tinham o direito de punir fisicamente os trabalhadores que se recusassem a trabalhar por rendimentos abaixo do mínimo necessário à sobrevivência, e ainda “proibiu-se, sob pena de prisão, pagar salários acima dos legais, e quem os recebesse era punido mais severamente do que quem os pagasse” (MARX, 2003 [1867], p.852).
O último objetivo da legislação sanguinária contra os proletários era proibir a coligação dos trabalhadores. A organização coletiva dos trabalhadores freqüentou, durante alguns séculos, na Europa Ocidental, mesmo durante a Revolução Francesa, as páginas das seções policiais dos jornais e dos códigos penais burgueses, que tratavam-na como um crime passível de pena de morte. O direito à organização profissional e política era reservada única e exclusivamente aos patrões. Tais leis foram abolidas, parcialmente, em 1825, e totalmente no final do século XIX, sob forte apelo dos operários.
Desde o século XIV até o século XIX, temos, de uma forma geral, uma total falta de organização política e de consciência de classe dos trabalhadores, rurais e urbanos, embora não possamos desconsiderar a ocorrência de algumas rebeliões e revoltas contra o nascimento do capitalismo[12]. Um dos resultados desta desmobilização popular é o aprofundamento da pauperização absoluta da classe trabalhadora, incapaz de impedir o avanço do capital, “(...) posto que além da expropriação dos seus meios de produção, romperam-se as condições sociais estabelecidas, que garantiam minimamente um sistema de proteções e obrigações, sem que, em seu lugar, se tivessem criado condições de suporte para suas carências mais básicas” (NASCIMENTO, 2004, p.60).
As legislações sociais propostas pela burguesia na primeira metade do século XIX – combate a vadiagem, mendicância – não enfrentaram o núcleo central da nova pobreza, limitando-se a atuar nos seus sintomas, efeitos e expressões. A atuação do Estado visava mediar, de forma institucional, os conflitos antagônicos de classe e apaziguar as tensões sociais derivadas do modo de produção capitalista, sem tocar no seu cerne, a relação de exploração que envolve capital e trabalho assalariado[13].
O combate ao desemprego e ao pauperismo passa, segundo as antigas leis inglesas, pelo ajuste moral, o compromisso religioso e a disciplina dos trabalhadores. Na mesma linha de raciocínio segue a economia política, que considera a miséria e o desemprego como frutos da escolha dos indivíduos, incapacitados, física e moralmente, a de se adaptarem a disciplina do trabalho fabril ou de resistirem às tentações dos vícios da vida moderna – alcoolismo, prostituição, mendicância –, decaindo ao nível do lúmpenproletariado. Amoralidade, indisciplina, pobreza, desemprego: é, desta forma, que o mundo do trabalho é visto e retratado por administradores públicos, associações de caridade, párocos e toda uma gama de conservadores e reacionários da ordem burguesa.
O balanço deste conjunto de leis contra os proletários e da expropriação dos meios de produção é que a formação e a dinâmica do mercado de trabalho não foram fruto da mão invisível do mercado. A força, monopolizada na máquina coercitiva do Estado, foi a responsável pelo longo e doloroso parto do capitalismo, de onde nasceram os burgueses, donos dos meios de produção e acumuladores de dinheiro, e os trabalhadores “livres”, arrancados da terra para ganharem menos do que o mínimo de subsistência nos centros urbanos, formando uma massa de força de trabalho disponível, como uma mercadoria qualquer, ao uso e abuso do consumo produtivo[14].
A proletarização dos trabalhadores rurais, destituídos à força dos seus meios de produção, abriu o caminho para a emergência de um modo de produção propriamente capitalista, capaz de subsumir, formal e realmente, os trabalhadores à lógica do capital, do valor que se autovaloriza continuamente sob o signo da produção de valor excedente.

5. Códigos de trabalho e os desocupados: uma questão social.
Apesar de Marx defender a teoria de que as populações errantes, durante os séc. XIV a XVIII, auxiliaram o desenvolvimento do capitalismo, Robert Castel, em seu “As metamorfoses da questão social – uma crônica do salário” (Ed. Vozes, 1998, Petrópolis/RJ), aponta algumas notas que merecem reflexão. Por volta de 1350, ápice dos movimentos de desfiliados pela Europa, o capitalismo, ainda em sua forma embrionária, estava restrito quase que apenas ao artesanato rural nas estruturas territoriais tradicionais. Ainda deve-se observar que as ditas “leis sangrentas” têm por objetivo bloquear a mobilidade da mão-de-obra, tão necessária ao desenvolvimento do capitalismo industrial, e fixar os “mendigos e vagabundos” a todo custo e a qualquer preço vil nas estruturas feudais. Para o autor supracitado esse “exército de reserva” para a nova estrutura de produção que se formava surgiu antes que esta pudesse absorve-los. Nas próximas linhas procura-se discutir o tema proposto sobre esse outro ponto de vista, diverso de Marx, mais para enriquecer as possibilidades de conclusões do que para contrapor teses; levando sempre em consideração as idéias trazidas por Castel.
Diante do acima exposto, alguns elementos devem ser retomados para serem interligados nessa jornada de excluídos pela Europa ocidental no início da idade moderna:
1) Deve-se ter em mente que o Cristianismo implantou na sociedade ocidental a prática de ajuda aos pobres e aos menos afortunados, enfatizando a santidade da vida. Em meados do séc. XII, e daí em diante, contudo, com o crescimento do poder absolutista dos reis, o Estado passou a assumir ou, pelo menos, dividir, por diversos fatores (surgimentos do movimento protestante e a doação tácita dos direitos políticos dos súditos ao soberano), os cuidados que a Igreja tinha pelos pobres criando, dessa forma uma polaridade, pelo menos, aparente: a caridade cristã versus o assistencialismo estatal.
2) A demarcação (privatização ou enclosures) das terras comuns dos feudos, também nessa época, somadas a eventos localizados como, por exemplo, a Guerra dos Cem anos entre a França e a Inglaterra, devastaram a área rural tornando a situação dos camponeses (servos) quase insustentáveis e obrigando muitos deles, desprovidos de suas ferramentas de trabalho e possuindo apenas sua força de trabalho como objeto de troca, a saírem de sua terra natal em busca de melhores condições de vida.
3) A Peste negra que assombrou a região no séc. XIV, produzindo uma queda demográfica, tornou a ferramenta humana um objeto em escassez, elevando a procura por mão-de-obra braçal e, pelo menos teoricamente ou momentaneamente, a retribuição pelos serviços realizados.
Assim é que surgem os primeiros códigos de trabalho desse período, com objetivos bem definidos, quais sejam: lembrar o imperativo da obrigatoriedade do trabalho à parcela da população que tem como único recurso de trabalho a força de seus braços; reafirmar o sistema de dependências da sociedade feudal que obriga o trabalhador a continuar no seu posto e a quem procure trabalho que o aceite pela primeira oferta feita nos limites do território ao qual pertença; bloquear a mobilidade ascendente da população vedando a negociação das retribuições oferecidas aos trabalhos prestados; proibir que o trabalho seja evitado através de ajudas do tipo assistencial. Estas diretrizes são aplicadas, em maior ou menor grau de severidade, em todas os lugares que tiveram de lidar com o crescimento do pauperismo. A título exemplificativo, segue trecho do Estatuto dos Trabalhadores, promulgado em 1349 por Eduardo III, rei da Inglaterra:
Dado que uma parte importante da população, especialmente entre trabalhadores e serviçais, foi, recentemente, vítima da peste, muitos, vendo a necessidade em que se encontram os senhores e a grande penúria de serviçais, não querem mais servir, a não ser que ganhem salários excessivos, e alguns preferem mendigar na ociosidade a ganhar a vida trabalhando. Nós, considerando os graves inconvenientes que, a partir de agora, uma penúria desse tipo provoca, após deliberação e de acordo com os nobres, os prelados e as pessoas instruídas que nos assistem, com seu consentimento, ordenamos:
Que cada súdito, homem ou mulher, de nosso reino da Inglaterra, qualquer que seja sua condição, livre ou servil, que seja válido, com menos de sessenta anos de idade, que não viva do comércio ou que não exerça ofício de artesão, que não possua bens dos quais possa viver, nem terras cuja cultura possa dedicar-se, e que não esteja a serviço de ninguém, se for requisitado para servir de um modo que corresponda ao seu estado será obrigado a servir àquele que assim o tiver requisitado; e receberá, pelo lugar que será obrigado a ocupar, somente o pagamento em gêneros, alimentos ou salário que estava em uso durante o vigésimo ano de nosso reinado, ou durante um dos cinco ou seis anos precedentes. Que fique entendido que o senhor sempre será preferido a qualquer outro por seus próprios servos e meeiros, de tal forma que estes sejam mantidos a seu serviço – mas que, entretanto, os senhores não sejam obrigados a conserva-los a seu serviço além do tempo necessário; e, se um homem ou uma mulher, sendo assim requisitado para servir, não o fizer, este fato sendo atestado por dois homens dignos de fé diante do xerife, do bailio, do senhor ou do preboste da cidade, ele ou ela será imediatamente levado por esses, ou por um desses, à prisão mais próxima onde será mantido sob rigorosa vigilância até que se tenha certeza de que servirá sob uma das formas enunciadas acima.
Que, se qualquer trabalhador ou serviçal deixar seu serviço antes do tempo requerido, será preso.
Que os antigos salários, sem nenhum acréscimo, serão dados aos trabalhadores.
Que, se o senhor de uma cidade ou de um domínio infringir de algum modo esta disposição, pagará uma multa equivalente ao triplo da soma dada.
Que, se um artesão ou um operário receber um salário mais alto do que aquele que lhe é devido, será preso.
Que os alimentos serão vendidos a preços razoáveis. Igualmente, porque muitos mendigos válidos, quanto mais puderem viver de esmolas, recusam-se a trabalhar e entregam-se a preguiça e ao vício e, as vezes, ao roubo ou a outras abominações, ninguém poderá, sob pena de sanções, dar nada, a título de piedade ou de esmola em suas inclinações, de tal forma que sejam obrigados a trabalhar para viver. (RIBTON-TURNER, History of vagrants and vagrancy, and beggars and begging, op. cit., p. 43-44, apud CASTEL, As metamorfoses da questão social – uma crônica do salário, p. 96-98, Ed. Vozes, 1998, Pretrópolis/RJ)
Escamoteado por esse coerente discurso pode-se verificar as reais intenções das elites da época, são elas: reduzir o fluxo excessivo de pessoas do campo para as cidades; tentar lidar, mesmo que de forma drástica, com a questão da mobilidade descendente, obrigando os trabalhadores a continuarem ou aceitarem postos de trabalho anteriormente ocupados; e, finalmente, barrar a mobilidade social ascendente, congelando os soldos percebidos pelos serviçais e impedindo ou dificultando a percepção de novo ofício. Isto não significa que a movimentação de pessoas entre os feudos nunca tinha existido, até então, pelo contrario, já se o percebia de modo satisfatório. O problema é que, até aquele momento identificavam-se duas classes de caminhantes. A primeira era formada por elementos externos à sociedade constituída tradicionalmente; pequenos grupos de desadaptados que ocupavam as regiões florestais ainda não colonizadas ao longo das estadas; eram os mendigos e bando de ladrões, então combatidos como inimigos. Uma segunda categoria de estradeiros era formada por elemento ou que integravam a sociedade feudal profissionalmente (comerciantes, soldados e religiosos) ou estavam apenas de passagem de um feudo para outro (estudantes universitários e peregrinos). Essa distinção não significa dizer que apenas o primeiro grupo cometia crimes e desordens, muito pelo contrário, eram freqüentes a prática pilhagem e outras atrocidades por parte de integrantes desse segundo nicho. Mercenários pertencentes ao exército, por exemplo, durante a Guerra dos trinta anos, aterrorizavam a população local com toda sorte de delitos.
A questão surge quando elementos que pertenciam internamente ao seio da sociedade passam agora a caminhar em direção às suas margens sendo então excluídos do sistema. Os servos, trabalhadores rurais, passam a freqüentar as estradas ou por terem sido expulsos de sua terra de origem ou por buscarem melhores condições de vida em terrenos alienígenas. Estes possuem agora, não mais suas ferramentas de trabalhos, foram expropriados delas, mas, apenas, sua força como mercadoria de troca. São os chamados pobres envergonhados ou mendigos válidos, frutos da mobilidade social descendente já explicitada.
Por esse motivo, entende Castel, serem estes, antecipadamente, os primeiros proletariados da história Para o autor não existe equivoco em empregar essa nomenclatura mesmo antes do desenvolvimento do capitalismo e aponta que São Tomas de Aquino e Jacques de Vitry já identificavam, em sua época, “mercenários”, cuja sobrevivência dependia exclusivamente do aluguel de sua força de trabalho.
Do já acima exposto pode surgir uma incongruência: se a população havia sido dizimada pela peste negra e os postos de trabalho estavam vagos, por que a população residual era tão numerosa a ponto de tornar-se um estorvo para a sociedade? A resposta não é simples e é fruto de uma série de fatores. O mais marcante, todavia, certamente é o fato de que a a-funcionalidade dessa população concernida e fruto de sua não qualificação para novas funções diferentes daquelas do trato com a terra. Posteriormente,diante dessa massa de desprovidos, as comunidades de ofício passavam, no séc. XIV, por um momento de fechamento, restringindo o aprendizado de seus mestres aos seus discípulos, aprendizes ou herdeiros, tentando evitar a concorrência, tão querida do sistema capitalista. Desse modo, as regulamentações de profissões e o surgimento dos ofícios “jurados”, mesmo que em pouca quantidade, contribuíram para que a população que tinha adquirido a liberdade do modo de produção servil não fosse inserida em um novo contexto produtivo que se vislumbrava.
Enfim, analisando toda a sistemática cruel dos códigos de trabalho não se pode deixar de fazer uma última indagação: será que se é verdadeiramente inocente quando se é desprovido de tudo? Para Castel, vagabundo identifica aquele desprovido de pertencimento comunitário (sem fé nem lei) cuja ociosidade esta associada à falta de recursos. Sob essas condições, é possível que muitos desfiliados praticassem delitos e merecessem punições. Mas a prática demonstrou que muitos sujeitos a essa legislação não atendiam aos requisitos necessários à pena. Ou eram inválidos – essa prática era até estimulada posto que essa parcela de vagabundos era mais facilmente capturável e serviria de exemplo para os demais – ou eram autóctones (moravam na cidade ou em seus arredores). Os depósitos de trabalhos forçados abrigavam toda sorte de loucos, crianças abandonadas e inválidos, e suas condições de trabalho eram inexistentes.
O enrijecimento das penas contra os criminosos com a criação de novas leis mais severas é um assunto que volta a tona nesse início de terceiro milênio, pelo menos aqui no Brasil. Os atos de brutalidade, típicos, e recrimináveis de uma grande parcela de excluídos que está autorizado a desconhecer códigos de ética impostos por uma comunidade da qual não faz parte (como preconiza Hobbes, em seu Leviatã), é recorrente nas manchetes e motivo de desconforto da sociedade constituída. Talvez a marcha dos desfiliados que começou na Europa ocidental, com declínio do sistema feudal, ainda não tenha chegado ao fim. Ainda não se sabe o que fazer com os excluídos.


Referências bibliográficas
· CASTEL, Robert. As metamosfoses da questão social – uma crônica do salário. Ed. Vozes, 1982.
· DEYON, Pierre. O mercantilismo. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2003.
· GROTIUS, Hugo. The Freedom of The Seas. Kitchener: Batoche Books Limited, 2000.
· MARX, Karl. A origem do capital – acumulação primitiva. 3ª edição. Editora Global.
· MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1996.
· WEBER, Maximilliam Carl Emil. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Ed. Pioneira, 2003.

[1] MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 21.
[2] MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 166.
[3] MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 171.
[4] “Theses islands of which we speak, now have and always have had their own king, their own government, their own laws, and their own legal system. The inhabitants allow the Portuguese to trade with them, just as they allow the other nations the same privilege. Therefore, inasmuch as the Portuguese pay tolls, and obtain leave to trade from the rulers there, they thereby give sufficient proof that they do not got there as sovereigns but as foreigners”. GROTIUS, Hugo. The Freedom of The Seas. Kitchener: Batoche Books Limited, 2000. p. 14.
[5] Aqui o autor ataca diretamente o Papa, as concessões de terra e soberania por ele realizadas. Abomina a religião da Igreja Católica Romana, religião esta que abandonou aos 12 anos de idade, convencendo inclusive sua mão de fazer o mesmo, por se considerar inteligente demais para a doutrina católica, abraçando, desde então, o protestantismo.
[6] Expressão que se tornou paradigmática da origem do capitalismo a partir do livro A Grande Transformação, de Karl Polanyi.

[7] Cf. Castel (1998), capítulos I e II

[8] No sentido de terem sido alienados dos seus meios de produção, dos processos de trabalho e do produto do seu trabalho. Cf. Capítulo III, seção 2.

[9] “Assim, a população rural, expropriada e expulsa de suas terras, compelida à vagabundagem, foi enquadrada na disciplina exigida pelo sistema de trabalho assalariado, por meio de um grotesco terrorismo legalizado que empregava o açoite, o ferro em brasa e a tortura” (MARX, 2003 [1867], pp.850-51).

[10] Sob um formato muito idêntico da legislação inglesa, foi aprovado um “Estatuto dos Trabalhadores”, em 1350, na França, sob ordens do Rei João.

[11] As leis de regulação dos salários só foram abolidas em 1813, quando a indústria tornou obsoleta tal regime de intervenção estatal sobre o nível do salário.

[12] “Nem sequer os camponeses e plebeus urbanos, aqueles que fizeram o trabalho sujo nas outras revoluções, surgiram à superfície durante a guerra civil inglesa, exceto em determinados atos simbólicos, breves e muito importantes” (MOORE Jr., 1983, p.24).

[13] “(...) as ações estatais, como as políticas sociais, têm como meta primordial o enfrentamento daquelas situações que possam colocar em xeque a ordem burguesa. Mas, evidentemente, esse atendimento não vai dirigido à raiz do problema; pelo contrário, é orientado para enfrentar algumas das manifestações da “questão social” como problemáticas particulares, fragmentando, estilhaçando e atomizando as demandas sociais como uma forma de reprimir, acalmar e calar qualquer voz que atente contra a coesão e a ordem socialmente estabelecida” (PASTORINI, 2004, p.110).

[14] “era necessário, porém algo mais do que o capital acumulado, antes que a produção capitalista em grande escala pudesse começar. O capital não pode ser usado como capital – isto é, para dar lucro – enquanto não houver o trabalho necessário para proporcionar esse lucro. Portanto, era necessária também uma oferta de trabalho adequada” (HUBERMAN, 1964 [1936], p.185).